A atenção está atualmente focada no cabotegravir/rilpivirina injetável para tratamento aprovado pela agência europeia (EMA) em 21 de dezembro de 2020 e pela FDA dos EUA em 21 de janeiro de 2021 e cabotegravir injetável para prevenção (que poderá ser aprovado em breve). Ver artigos neste Boletim.
Mas há outros produtos de longa duração desenvolvidos ou em desenvolvimento:
- O anel vaginal dapivirina mensal para prevenção já está aprovado (e versões que duram três meses ou que também fornecem anticoncepcional estão em processo). Ver artigo neste Boletim.
- O novo agente lenacapavir está sendo testado como uma injeção semestral, enquanto o islatravir tem tal persistência no corpo que pode funcionar como uma pílula mensal ou um implante com duração de um ano inteiro. Ver artigo neste Boletim.
Para a prevenção do HIV, apenas um agente de ação prolongada pode ser suficiente para fornecer proteção. Mas, para o tratamento do HIV, provavelmente serão necessários dois ou três. Construir esquemas completos de agentes de ação muito longa será um desafio até que vários produtos eficazes para a mesma duração estejam disponíveis.
O ibalizumabe já está disponível como uma infusão a cada duas semanas para o tratamento do HIV multirresistente, mas deve ser tomado em combinação com comprimidos diários.
Por exemplo, o ibalizumabe já está disponível como uma infusão a cada duas semanas para o tratamento do HIV multirresistente, mas deve ser tomado em combinação com comprimidos diários. Portanto, não tem as qualidades que muitas pessoas consideram atraentes em um esquema de ação prolongada – dosagem menos frequente, lembretes menos frequentes da sorologia positiva para o HIV e maior discrição.
Para o Dr. Hyman Scott, ter produtos de longa duração como opções adicionais em suas clínicas de São Francisco permitirá que ele alcance pessoas que têm problemas com a dosagem diária. A experiência com anticoncepcionais e medicamentos antipsicóticos é que ter mais opções permite que os médicos se envolvam com indivíduos que têm barreiras para a adesão à pílula diária.
O professor François Venter estava menos convencido que as pessoas que têm dificuldade em tomar medicamentos todos os dias comparecerão às consultas a cada quatro ou oito semanas. Os antirretrovirais injetáveis não são “a solução mágica para a adesão”, disse ele. “Inicialmente e até que tenhamos melhores dados, vou reservar para os pacientes mais aderentes.”
Scott disse que imaginou dois grupos principais de pacientes que desejariam produtos de longa ação:
- Em primeiro lugar, indivíduos altamente aderentes e organizados que simplesmente preferem essa opção.
- Em segundo lugar, pessoas que têm desafios com a adesão diária.
Ele não manifestou tanta preocupação quanto Venter sobre a capacidade desses pacientes de comparecer às consultas regularmente. “Tenho muitos pacientes que aderem às consultas sem aderir aos comprimidos diários”, afirmou. A medicação injetável pode ser oferecida ao mesmo tempo que a visita de uma pessoa para outros serviços, como gerenciamento de caso.
“Tenho muitos pacientes que aderem às consultas sem aderir aos comprimidos diários.”
O preço será um fator chave para determinar quantas pessoas podem usar produtos de longa duração. Nos EUA, o cabotegravir/rilpivirina injetável para tratamento foi posicionado no topo da faixa de preço para esquemas patenteados de um comprimido por dia, mas não com o mesmo prêmio de preço dos medicamentos para tratar HIV multirresistente. Segundo a Fundação Clinton, o preço em países de baixa renda deveria ser inferior a 131 dólares anuais para ter custo-efetividade.
Não sabemos como será o preço do cabotegravir para prevenção, mas ele será comparado com a PrEP oral, que é altamente eficaz e está disponível a um custo muito mais baixo nos fabricantes de genéricos. Um estudo apresentado na CROI descobriu que para ser considerado custo-efetivo pelos sistemas de saúde, um produto de ação prolongada poderia ser apenas cerca de US$ 3.000 por ano mais caro do que o tenofovir/entricitabina genérico nos Estados Unidos. Na Europa, onde os genéricos são mais baratos, o preço teria que ser ainda mais baixo.
UMA INTERVENÇÃO COMPLICADA
Será possível entregar agentes de longa duração em países de baixa e média renda? François Venter disse que na África do Sul há um grande entusiasmo dos pacientes, enquanto os profissionais de saúde se preocupam mais com os desafios operacionais. O fluxo de trabalho de clínicas já sobrecarregadas terá que ser repensado, ou precisarão ser identificados prestadores de serviços alternativos, como farmácias comerciais.
Embora o país tenha um grande programa de entrega de anticoncepcionais injetáveis, a experiência é que as pacientes entram e saem da assistência. Isso levanta preocupações sobre o surgimento de resistência aos medicamentos, o que torna ainda mais urgente a necessidade de trazer os indivíduos de volta aos cuidados. No entanto, isto é mais uma tarefa para os programas, que não têm histórico de fazer isso bem.
Os tratamentos injetáveis seriam uma “intervenção complicada” para implementar no programa de terapia antirretroviral da África do Sul, que é o maior do mundo.
Os tratamentos injetáveis seriam uma “intervenção complicada” para implementar no programa de terapia antirretroviral da África do Sul, que é o maior do mundo. Venter estava mais aberto aos benefícios potenciais da PrEP injetável, dado o número limitado de pessoas alcançadas pela PrEP oral até agora.
O sucesso da expansão da PrEP oral na Tailândia se baseou em serviços liderados pela populações-chave, nos quais trabalhadores de saúde comunitários (principalmente homens que fazem sexo com homens e mulheres transexuais) entregam PrEP a seus pares, muitas vezes em ambientes não médicos. O Dr. Nittaya Phanuphak disse que uma pesquisa de implementação é necessária para descobrir se os agentes de longa ação podem ser fornecidos por leigos. Produtos que poderiam ser administrados por um colega ou pelo próprio usuário seriam bem-vindos, disse ela. No entanto, como o cabotegravir e a rilpivirina devem ser injetados em um músculo grande o suficiente para receber o volume necessário, as nádegas são atualmente o único local viável e o licenciamento concedido exige sua administração por um profissional de saúde.
Uma preocupação adicional é que muitas mulheres transexuais receberam injeções de preenchimento nas nádegas. “Se não conseguirmos encontrar nenhum outro grupo muscular, isso excluirá automaticamente as mulheres trans de receber cabotegravir injetável”, disse Phanuphak.
PERÍODO DE INTRODUÇÃO E A CAUDA LONGA
Especificamente para cabotegravir e rilpivirina, alguns dos dados emergentes permitirão que protocolos sejam simplificados, enquanto outros dados podem dar lugar a maior complexidade.
Usado como prevenção, o cabotegravir é administrado a cada oito semanas. Já quando usado como tratamento, a combinação cabotegravir/rilpivirina foi testada com dosagem a cada quatro semanas (aprovado pelos reguladores europeus e americanos) e a cada oito semanas (aprovado apenas pelos reguladores europeus). Os dados apresentados na CROI mostraram que a dosagem de oito semanas não é inferior, mas é provavelmente menos indulgente com os atrasos na administração das doses. Além disso, as análises até agora fornecem pouca orientação sobre quais pacientes têm maior probabilidade de se beneficiar de cada esquema.“Embora existam alguns desafios operacionais e detalhes que precisam ser resolvidos, eles não devem impedir a implantação dos antirretrovirais injetáveis.”
Os dados apresentados na CROI mostraram que a dosagem de oito semanas não é inferior, mas é provavelmente menos indulgente com os atrasos na administração das doses.
Para o uso de antirretrovirais injetáveis, os estudos de pesquisa e as aprovações regulatórias atuais exigem iniciar com a administração durante quatro semanas das versões orais dos medicamentos, um período de introdução. A justificativa é garantir que os medicamentos sejam bem tolerados, uma vez que uma injeção não pode ser removida se houver efeitos adversos. Nos estudos até agora realizados, não surgiram preocupações com a segurança. Também há alguns dados de tratamento sugerindo que o período de introdução com a medicação oral não seja necessário. Hyman Scott disse na reunião que se sentia confortável em dar aos pacientes a opção de receber as injeções “fora da bula”, sem o período de introdução.
Existe uma preocupação relevante para o cabotegravir usado na prevenção, com a ‘cauda longa’. A ‘cauda longa’ é o período de vários meses após a última injeção numa pessoa, durante o qual os níveis do medicamento diminuem lentamente, mas ele ainda continua presente. Como a pessoa pode ter o fármaco ativo em seu corpo, em nível insuficiente para proteger contra o HIV, a preocupação é que, caso adquira o HIV, possa desenvolver resistência ao cabotegravir e a outros inibidores da integrase (família de medicamentos muito utilizada para tratamento na atualidade). Os protocolos de teste de pesquisa declararam que as pessoas que pararam as injeções devem receber PrEP oral para “cobrir” essa cauda, mas isso nem sempre será possível – muitas pessoas simplesmente param de ir à clínica.
No entanto, os dados do HPTN 083 apresentados à CROI foram tranquilizadores: quatro indivíduos que soroconverteram durante o período de cauda longa não desenvolveram resistência. Pode ser precisamente porque os níveis do medicamento estavam baixos que a resistência não ocorreu – o risco de resistência é maior quando o HIV se replica na presença de altos níveis de um medicamento que, por si só, não é suficiente para impedir a replicação do vírus.
MELHORANDO OS TESTES
O novo desafio revelado por aquele estudo foi a baixa sensibilidade dos exames diagnósticos de rotina em pessoas que estão em uso de cabotegravir. As infecções por HIV de algumas pessoas não foram detectadas por testes de anticorpos por várias semanas ou meses. Um fenômeno similar já foi observado em um pequeno número de usuários de PrEP oral, mas o efeito parece ser mais pronunciado com o fármaco injetável.
O teste mais sensível seria para RNA (carga viral), mas ele é caro e vem com os desafios logísticos de um teste de laboratório.
Nittaya Phanuphak disse que os serviços tailandeses dependem de testes rápidos de terceira geração, que são especialmente propensos a ignorar esses casos. O teste mais sensível seria para RNA (carga viral), mas ele é caro e vem com os desafios logísticos de um teste de laboratório. Uma opção a ser considerada é o teste de RNA agrupado em “pool”, já usado para rastrear doações de sangue. Amostras de cerca de 100 pessoas são reunidas e testadas. Se o teste do “pool” for negativo, todas as amostras serão consideradas negativas. No entanto, se o teste do pool for positivo, “pools” progressivamente menores (de 50, depois de 10) são testados até que cada uma das amostras positivas do RNA do HIV sejam isoladas.
Uma segunda opção são os testes de RNA de ponto de assistência ou próximo ao ponto de assistência. Essas tecnologias avançaram consideravelmente nos últimos anos, mas ainda há progresso a ser feito em termos de conveniência, prazos de entrega, custos de operação e precisão.
A Dra. Rachel Baggaley, da Organização Mundial da Saúde (OMS), disse em uma reunião de ativistas da comunidade que o desenvolvimento de estratégias práticas para testagem será a chave para garantir que a PrEP injetável não seja um produto reservado para países de alta renda.
O professor Raphael Landovitz, que liderou o HPTN 083, acrescentou: “Para mim, este é um apelo galvanizador para que todos exijam que invistamos mais recursos em diagnósticos melhores, mais sensíveis e ainda bastante específicos, incluindo testes de ponto de assistência que tenham essas propriedades.”
Melhores diagnósticos são necessários em ambientes de alta e baixa renda. O acesso a testes de carga viral em pontos de atendimento melhorou no sul do mundo, mas geralmente não estão disponíveis em todos os ambientes, mesmo os de alta renda.
O acesso a testes de carga viral em pontos de atendimento melhorou no sul do mundo, mas geralmente não estão disponíveis em todos os ambientes, mesmo os de alta renda.
E embora os dados mais recentes tenham identificado alguns desafios operacionais e detalhes que precisam ser resolvidos, Landovitz disse que eles não deveriam impedir a implantação do cabotegravir injetável. Ele insistiu que não devemos perder de vista o panorama geral – seu impacto nas infecções por HIV. Em comparação com pessoas que usam PrEP oral, houve 66% menos infecções em homens que fazem sexo com homens e mulheres trans e 89% menos infecções em mulheres cisgênero nos dois estudos principais. Esses resultados são “surpreendentes”, disse ele.