A atualização foi anunciada na 10ª Conferência da Sociedade Internacional de AIDS (IAS) sobre Ciência do HIV (IAS 2019), na Cidade do México. A Conferência contou com inúmeras apresentações sobre a PrEP, incluindo um relatório de que nenhum participante do estudo francês PRÉVENIR que usou consistentemente a PrEP diária ou sob demanda adquiriu o HIV.
A PrEP sob demanda (também chamada de PrEP intermitente) envolve tomar uma dose dupla (duas pílulas) de Truvada (tenofovir disoproxil fumarato/entricitabina; TDF+FTC) entre 2 e 24 horas antes do sexo ser previsto e, em caso de sexo, uma pílula 24 horas após a dose dupla e outra 24 horas mais tarde. Se o sexo ocorrer vários dias seguidos, um comprimido deve ser tomado todos os dias, até 48 horas após o último evento.
Em 2015, o Dr. Jean-Michel Molina, da Universidade de Paris, relatou que a PrEP sob demanda reduziu o risco de infecção pelo HIV em 86% entre gays e bissexuais masculinos no estudo francês IPERGAY – igualando o efeito protetor da PrEP diária relatada no estudo PROUD, no Reino Unido.
Depois do IPERGAY, o grupo de Molina embarcou no estudo PRÉVENIR, que visa mostrar que a inclusão de mais 3000 homens na região de Paris na PrEP levaria a uma redução de 15% no diagnóstico de HIV entre HSH. Os participantes do estudo puderam optar por tomar o TDF+FTC diariamente ou sob demanda, e eles puderam mudar de grupo durante o estudo.
Na Conferência Internacional de AIDS de Amsterdã, em 2018, Molina relatou que nenhuma nova infecção pelo HIV havia ocorrido entre homens que usavam algum dos dois esquemas de PrEP. Na IAS 2019, ele apresentou uma atualização mostrando que a PrEP permanece eficaz com um acompanhamento mais longo.
Desde o início de maio de 2019, o PRÉVENIR registrou 3.057 homens em 26 locais, superando a meta original. Quase todos eram HSH, mas 30 se identificaram como heterossexuais e 13 pessoas transexuais também foram incluídas. A maioria (85%) era branca e a idade mediana era 36 anos. Mais da metade dos participantes não tinha um parceiro sexual regular. Eles tiveram uma média de 10 parceiros sexuais durante os últimos 3 meses e uma média de dois atos de sexo sem preservativo no último mês. O Quimsex, ou uso de drogas recreativas quando tiveram relações sexuais, foi relatado por 14%.
A maioria (85%) era branca e a idade mediana era 36 anos. Mais da metade dos participantes não tinha um parceiro sexual regular.
Cerca de metade dos homens optou pela PrEP sob demanda, e essa proporção permaneceu consistente ao longo de 18 meses de acompanhamento. Cerca de 15% mudaram de regime, com um número igual de mudanças de doses diárias para intermitentes e de doses intermitentes para diárias.
Quase todos os homens (97%) no braço diário da PrEP, mas apenas 82% no braço de uso sob demanda, disseram que tomaram a PrEP conforme indicado a última vez que fizeram sexo. A razão mais comum para não tomar PrEP foi sentir que o sexo era de baixo risco. Cerca de 20% em ambos os grupos relataram o uso de preservativos quando fizeram sexo pela última vez.
Dois homens soroconverteram durante o acompanhamento, ambos no grupo sob demanda, para uma taxa de incidência de 0,09 por 100 pessoas-ano. A incidência foi muito baixa nos dois grupos: 0 e 0,2 por 100 pessoas-ano, respectivamente, entre aqueles que tomavam a PrEP diária e intermitente. Molina estimou que o uso da PrEP evitou 143 novas infecções pelo HIV.
Ambos os homens que soroconverteram pararam de tomar a PrEP várias semanas antes e fizeram sexo sem preservativo nesse ínterim. Um homem de 52 anos iniciou a PrEP sob demanda em abril de 2016 e se inscreveu no PRÉVENIR em fevereiro de 2018. O outro, 47 anos, iniciou a PrEP diária em junho de 2016, mas optou pela dosagem intermitente quando ingressou no PRÉVENIR em junho de 2017. Nenhum deles mostrou evidência de resistência ao tenofovir ou à entricitabina.
O número de atos sexuais e número de parceiros sexuais foi maior nos usuários diários da PrEP em comparação com os usuários intermitentes.
O número de atos sexuais e número de parceiros sexuais foi maior nos usuários diários da PrEP em comparação com os usuários intermitentes. Em ambos os grupos, a frequência do sexo aumentou 43% após o início da PrEP, mas depois estabilizou. Por outro lado, o número de parceiros sexuais diminuiu em 20% após iniciar a PrEP.
Molina relatou que as infecções bacterianas sexualmente transmissíveis (IST) foram comuns, aumentando em 38% desde o início do estudo até o 18º mês. A taxa geral de incidência foi de 86 por 100 pessoas-ano. As IST foram mais comuns no braço de PrEP diária tanto no início do estudo como aos 18 meses. Ele também disse que nove homens em PrEP diária e 11 em PrEP intermitente contraíram o vírus da hepatite C durante o acompanhamento. Ele comentou que a taxa de incidência de hepatite viral de 1,04 por 100 pessoas-ano – que inclui um caso de hepatite A, outro de hepatite B e outro de hepatite E – foi bastante alta e os pesquisadores estavam tentando abordar esse problema.
Tanto a PrEP diária quanto sob demanda foram bem toleradas. Eventos adversos relacionados a medicamentos foram incomuns e semelhantes em ambos os grupos. Apenas três pessoas pararam de tomar TDF+FTC devido a efeitos colaterais gastrointestinais.
Molina fez parte do grupo que desenvolveu o resumo técnico da OMS sobre a PrEP sob demanda.
Em 2015, a OMS recomendou que a PrEP oral “deve ser oferecida como uma opção adicional de prevenção para pessoas com risco substancial de infecção pelo HIV como parte de uma abordagem de prevenção combinada”, mas não endossou o regime sob demanda.
A atualização diz que a dosagem de PrEP sob demanda é uma opção para os HSH. Este esquema é apropriado para homens que consideram a PrEP intermitente mais eficaz e conveniente, aqueles que fazem sexo com menos frequência e aqueles que podem planejar o sexo com pelo menos duas horas de antecedência.
A PrEP sob demanda não é recomendada para mulheres cisgênero ou transgênero, homens transgênero que têm sexo vaginal/frontal ou homens que fazem sexo com mulheres.
Neste momento, a PrEP sob demanda não é recomendada para mulheres cisgênero ou transgênero, homens transgênero que têm sexo vaginal/frontal ou homens que fazem sexo com mulheres. Para mulheres cisgênero, doses de carga mais altas ou co-formulações com inibidores da integrase podem ser necessárias para a droga atingir rapidamente os níveis protetores no trato genital feminino. Pesquisas adicionais são necessárias.
Também não é adequada para pessoas com hepatite B crônica. O tenofovir é ativo contra o vírus da hepatite B, assim como o HIV, e as pessoas com hepatite B devem tomar tenofovir ou outro antiviral continuamente.
O resumo da OMS expõe os benefícios da PrEP sob demanda, incluindo a conveniência para homens gay que têm um alto risco de contrair o HIV durante um breve período (por exemplo, em férias) ou que fazem sexo com pouca frequência; uma menor carga de comprimidos e menor custo. Mas também carrega riscos potenciais. O resumo diz que deve-se ter cautela ao documentar o uso de PrEP sob demanda em locais onde a atividade sexual entre pessoas do mesmo sexo é criminalizada.
REFERÊNCIAS:
• Molina JM et al. Incidence of HIV-infection with daily or on-demand PrEP with TDF/FTC in Paris area. Update from the ANRS Prévenir Study. 10th International AIDS Society Conference on HIV Science, Mexico City, abstract TUAC0202, 2019. Veja este resumo no website da IAS 2019.
• WHO What’s the 2+1+1? Event-driven oral pre-exposure prophylaxis to prevent HIV for men who have sex with men: Update to WHO’s recommendation on oral PrEP. July 2019.