Capítulo
I
Rede
Paulista de Mulheres com HIV/Aids:
Lugar possível de tecer solidariedade, empoderamento e cidadania
SEGUNDO ANO: Plantando em
Comunidades
Em nosso segundo ano, seguimos preocupadas com as mulheres
que ainda não tinham acesso a importantes discussões para continuar
vivendo o melhor possível com HIV/aids, tais como: saúde reprodutiva,
sexualidade, relações de gênero, acesso ao mercado de trabalho, relacionamento
com os filhos, adesão aos medicamentos, importância da participação
comunitária etc.
Nossa perspectiva foi estimular a criação de projetos
de vida, os quais reconhecemos serem importantes instrumentos de sustentação
e geradores de qualidade deste viver. Nas várias atividades desenvolvidas,
sustentamos a tese do “fazer junto fica mais fácil”, incentivando
a organização e participação das mulheres. Este espaço coletivo significava
a possibilidade de compartilhar suas necessidades, buscar alternativas
e encontrar um espaço de pertencimento, frente à exclusão social enfrentada
pelas mulheres com HIV/aids.
Estimulamos a plantação de pequenas hortas comunitárias
em espaços de serviços de saúde, ONG, terrenos da prefeitura, quintais
particulares. Enfim, qualquer espaço cedido, que pudesse representar
um lugar onde as pessoas pudessem se encontrar, conversar e praticar
o “fazer junto” nas hortas.
Essa estratégia foi fundamental para discutirmos eixos
centrais na relação terra/sujeito. Possibilitou o aprendizado da relação
com a terra, com o outro, com a vida e com o HIV. Escolher as sementes
próprias para as diferentes épocas do ano, regar, limpar, transplantar,
colher e a importância da participação coletiva para viabilizar o
trabalho, foram sempre aprendidas e refletidas num paralelo com o
diagnóstico do HIV.
Assim, o trabalho com a horta, que tinha como enfoque
o plantio e a alimentação saudável, falava dos cuidados consigo, dos
tempos da vida. Esta prática foi sendo construída conjuntamente com
os relatos do dia-a-dia das pessoas com HIV/aids no campo das relações
afetivas, do bem-estar físico e emocional, das relações com o mundo
e da manutenção da vida.
Além das hortas, realizamos alguns encontros e palestras
abordando temas como: orientação profissional, conversas com crianças
sobre sexualidade e aids, gravidez e HIV, nutrição, práticas de cozinha
com a exploração alternativa de alimentos.
No entanto, o enfoque maior do trabalho foi para a
reflexão sobre a sexualidade, as relações de gênero e o empoderamento
das mulheres e, por isso, realizamos um programa de nove oficinas4
abordando essas temáticas. Este ano da Rede foi intenso e acreditamos
que obtivemos bons resultados como a ampliação de informações e reflexões
e mudanças de atitudes frente aos desafios trazidos pela aids.
Outros produtos do nosso trabalho foram o Boletim da
Rede, um vídeo sobre horta, um livro sobre nutrição (que inclui receitas)
e o Álbum de Clara, um material para trabalhar a subjetividade das
mulheres com HIV/aids.
Com o apoio da GLAMS/INSP também realizamos o Seminário
“Direitos Reprodutivos, Exclusão Social e Aids”5
, em parceria com o IMS/UERJ e a Rede Saúde. Ainda neste ano, fizemos
uma parceria com o Instituto de Saúde de Mulher e da Criança para
a orientação e acompanhamento na utilização do preservativo.
4 - Estas oficinas foram
reproduzidas no Mutirão da Vila Mara – São Miguel Paulista. No capítulo
3 apresentamos uma discussão sobre o processo das oficinas. 5 - Recebemos pessoas de várias cidades do Brasil e para nós
o maior avanço foi a participação marcante de mulheres com HIV/aids,
concretizando o que era nosso objetivo quando do estabelecimento desta
parceria, ou seja, dar voz às mulheres com HIV/aids que tinham experiência
em sua comunidade e que ocuparam lugares nas mesas como expositoras/coordenadoras
e na platéia. Em relação às temáticas, abordamos: direitos reprodutivos,
exclusão, identidades, subjetividade, relações de gênero, trabalhos
em grupos e atendimentos em serviços públicos de saúde, além de depoimentos
sobre a trajetória de vida e luta das mulheres vivendo com a aids.