Brasil sem Discriminação

O Projeto “Brasil sem Discriminação” tem por objetivo a redução do Estigma, Preconceito e Discriminação e a ampliação de ações de Direitos Humanos em defesa das pessoas vivendo com HIV/Aids, com atuação nas cidades de Niterói (RJ), São Paulo (SP) e Serra (ES). O mesmo tem como um dos focos de atuação disseminar informações acerca de Prevenção Secundária (junto a pessoas vivendo com HIV/Aids) e ampliar as discussões e reflexões sobre os aspectos legais da transmissão do HIV em relações consensuais.

Para saber mais sobre as questões abordadas pelo projeto

Material de apoio coletado pelo projeto Brasil sem Discriminação.
Compilação de documentos organizados e traduzidos pelo GIV como: Declaração de Oslo sobre a criminalização do HIV, Documento da Comissão Federal Suíça, Parecer do Conselho Nacional de Aids da França, Novas Diretrizes Britânicas, Notas Técnicas da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo e do Ministério da Saúde.

 

Inclusão Social

No Brasil os medicamentos antirretrovirais, que controlam a evolução do vírus HIV, são fornecidos gratuitamente, mas sozinha essa ação não basta. O perfil social das pessoas atingidas pela epidemia vem acarretando questões de difícil superação, como, por exemplo, a falta de acesso ao Trabalho, à Assistência e à Previdência Social. Estas situações exigem respostas que permitam a inclusão social, acesso a benefícios e ao mundo do trabalho para Pessoas Vivendo com HIV Aids (PVHA).

Com o uso da terapia antirretroviral, as pessoas que apresentam boa adesão terapêutica, bons níveis de avaliação clínica, boa resposta imunológica (CD4) e baixa concentração de vírus (Carga Viral), e não sofrem sequelas do vírus, podem ser consideradas (avaliadas caso a caso) capazes de trabalhar e contribuir para a Previdência Social. Às pessoas aptas ao trabalho e, se exercem atividade remunerada, recomendamos a inscrição como contribuinte na Previdência Social (“Inclusão Previdenciária”), para que no futuro, se sofrerem alguma intercorrência, sejam consideradas beneficiárias e tenham acesso a um dos benefícios da Previdência Social.

Infelizmente e equivocadamente, os critérios de acompanhamento biológico dos medidores de CD4 e Carga Viral vêm sendo utilizados isoladamente em muitos casos na análise pericial para concessão de benefícios previdenciários. Não sendo considerado amplamente o contexto das PVHA, como portadoras de doença crônica degenerativa, deixando-se de realizar uma análise mais ampla de sequelas e efeitos colaterais sofridos, que podem se configurar indícios de incapacidade laborativa.

Este tem sido o entendimento da comunidade científica que hoje reconhece tanto no Documento de Consenso Para Terapia Antirretroviral e em diversos artigos científicos publicados, que o longo tempo de uso dos antirretrovirais e a atividade viral no organismo podem causar graves efeitos colaterais, que podem acarretar envelhecimento precoce, comprometimento de órgãos vitais, perda óssea, além de outras sequelas que impossibilitam, por vezes, a atividade laborativa.

Entretanto várias PVHA relatam a dificuldade de acesso aos benefícios da Previdência Social além de receberem alta indiscriminada em benefícios, sem observância de qualquer critério científico. Ressaltamos que apesar dos avanços no tratamento, o Brasil apresenta (desde o início da epidemia) as mesmas dificuldades de acesso ao trabalho para os portadores de HIV/Aids decorrentes da inexistência de um programa político de inclusão social e de recolocação, readaptação e orientação. Estigma, preconceito, faltas eventuais ao trabalho para o tratamento, danos à saúde causados por doenças oportunistas e efeitos colaterais de medicamentos são determinantes das dificuldades para a inserção no mundo do trabalho.

O trabalhador portador do HIV/Aids não tem estabilidade no emprego e pode, sem justa causa, ser demitido a qualquer tempo, mas nunca pelo fato de portar o vírus da Aids. Para as pessoas que foram violadas e buscaram seus direitos, a Justiça respondeu com uma jurisprudência nacional que garante o acesso a Previdência e a Assistência social, repudia as demissões em decorrência do preconceito e discriminação. Falta agora uma ação política mais firme por parte do Estado.

Portador do Vírus HIV/Aids, veja se você tem direito aos benefícios da Previdência ou da Assistência Social.

O Serviço Social do INSS mais próximo de você pode ajudá-lo, a saber, se você possui direito social ou legal para receber algum Benefício, seja Auxílio Doença; Aposentadoria por Invalidez; Amparo ao Deficiente (LOAS), ou Pensão por Morte, favorecendo sempre o seu acesso e quando possível, o restabelecimento para o trabalho. Benefícios relacionados à incapacidade para o trabalho que as pessoas que vivem com HIV/Aids pode requerer:

Auxílio Doença

Você terá direito a esse benefício se estiver vinculado à Previdência Social, seja com Carteira de Trabalho assinada pelo seu patrão ou através de Contribuição Individual (carnê) e estiver incapacitado para exercer suas atividades de trabalho.

Aquele que tem carteira assinada e ainda está trabalhando, poderá ficar afastado do trabalho por no máximo 15 dias, apresentando ao patrão atestado médico do SUS ou ter seus dias abonados pelo médico da empresa. Se ao final dos 15 dias sua capacidade para trabalhar não esteja recuperada, deverá no 16º dia de afastamento do trabalho, requerer o auxílio doença, fazer perícia médica e permanecer com este benefício até que o médico dê alta.

Se você não tem carteira assinada, mas paga o Carnê da Previdência, não deverá esperar os 15 dias para requerer o Auxílio Doença. Você deverá “dar entrada” no pedido assim que não puder mais trabalhar.

É importante nestes casos que você apresente na perícia, para melhor avaliação, toda a documentação médica que comprove a sua situação. E que são as Declarações Médicas bem detalhadas, exames e receitas.

Se você está desempregado, também poderá requerer esse benefício se estiver no período de graça da Previdência Social. Que período é esse? É o período em que você mesmo sem contribuir mantêm o direito de receber o benefício.

É importante você saber que não é o fato de ser portador do vírus da aids que lhe garante o direito ao benefício. Você terá que provar que não tem capacidade para trabalhar.

Aposentadoria

Caso você não possua mais a mínima condição de retornar ao trabalho e seja considerado inválido, o médico perito poderá sugerir, depois de avaliação, que você seja aposentado por invalidez, que neste caso nada mais é, do que a continuidade do auxílio doença, necessitando, portanto, de exame pericial a cada 2 anos após a sua concessão.

Benefício de Prestação Continuada da lei orgânica da assistência social:

Caso você esteja incapacitado para o trabalho, mas perdeu a qualidade de segurado da Previdência Social porque não trabalha há muito tempo ou porque nunca trabalhou, pode requerer o Benefício de Prestação Continuada previsto na Lei Orgânica da Assistência Social (Lei nº8.742/93).

Este benefício é destinado ao idoso e ao portador de deficiência de qualquer idade, que esteja incapacitado para o trabalho e não tenha condições de prover a própria subsistência ou de tê-la provida por sua família.

Ele garante um salário mínimo por mês e a renda “per capita” familiar inferior a um quarto do salário mínimo.

As crianças e adolescentes carentes de até dezesseis anos, portadores de deficiência, cuja família não tenha condições financeiras de cuidá-los ou que estejam abrigados em Casas de Apoio, têm direito a este benefício conforme previsto nas Orientações Internas DIRBEM nº61 e nº64.

O processo de "desestigmatização"

Atualmente há novas estratégias de prevenção ao HIV sendo implementadas e discutidas, bem como uma abordagem de promoção do gerenciamento de risco que possibilitam compreender uma série de métodos de barreira que podem ser utilizados em conjunto ou individualmente, sendo agregados ao uso do preservativo ou não. Entre essas novas estratégias destacamos:

Profilaxia pós-exposição

Trata-se de uma combinação de três antirretrovirais (medicamentos que são utilizados para tratamento da aids) que deve ser iniciada em até 72 horas após uma exposição de risco, como, por exemplo, sexo desprotegido ou rompimento de preservativo. Esta profilaxia está nos Serviços de Atendimento Especializados e em emergências de hospitais públicos que tratam de pacientes com HIV/Aids.

Tratamento como prevenção

Estudos científicos demonstram que um indivíduo que possui carga viral (do HIV) abaixo dos níveis de detecção, que usa antirretrovirais de modo adequado, não apresentando nenhuma DST, mantendo essa situação por mais de seis meses, sua possibilidade de transmitir o vírus é reduzida consideravelmente. Nesse sentido, considerando-se que não existe nenhuma forma de prevenção 100% segura, essa estratégia foi adotada no Brasil em casais onde um dos parceiros não tem HIV, iniciando o tratamento independentemente da contagem de CD4.

Profilaxia pré-exposição

Inclui diversas formas de uso de antirretrovirais por pessoas que não são portadoras do HIV, tanto via oral quanto em forma de gel. Essa metodologia não está implementada no Brasil como política pública, mas é fundamental que se discuta sobre ela.

O conhecimento sobre essas possibilidades contribui para o processo de “de-sestigmatização” da pessoa que vive com HIV/Aids que muitas vezes é discriminada quando há uma identificação dos portadores do HIV com o próprio vírus, como vetores transmissores da infecção.

Criminalização da transmissão do HIV

Existem diversos casos, inclusive no Brasil, de criminalização da transmissão do HIV em relações consensuais, ou seja, pessoas que alegam terem sido infectadas por parceiros (fixos ou eventuais) recorrem ao sistema judiciário para criminalizar aqueles a quem atribuem a responsabilidade de terem transmitido a elas o HIV. A rigor cada caso deve ser tratado de forma individualizada, sendo sempre necessária a análise e os devidos esclarecimentos do contexto em que tal transmissão ou exposição ao risco de transmissão ocorreu.

Certamente, generalizar o uso de leis penais para uma questão de saúde pública não resolverá o problema estabelecido, além disso, corre-se o risco iminente de induzir mais estigma e preconceito às pessoas que vivem com HIV/Aids. Cabe aqui ressaltar a posição do Ministério da Saúde em relação a essa temática, por meio da Nota a seguir:

NOTA TÉCNICA Nº 350/2009/D-DST-AIDS-HV/SVS/MS

Assunto: Nota técnica sobre a criminalização da transmissão sexual do HIV.

1 - O Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais vem a público manifestar a preocupação de que a criminalização da transmissão sexual do HIV constitua um retrocesso na política brasileira de enfrentamento da epidemia da aids, podendo contribuir para o aumento do estigma e preconceito.

2 - O Programa das Nações Unidas para HIV/Aids (UNAIDS) posicionou-se por meio de documento em que afirma que “não existem dados que demonstrem que a aplicação generalizada da lei criminal à transmissão do HIV sirva para se fazer justiça ou para prevenir a transmissão[1]. O Brasil ratifica a posição do UNAIDS.

3 - O UNAIDS afirmou, no relatório sobre a epidemia mundial de aids, de 2009[2], que as novas infecções pelo HIV reduziram 17% nos últimos oito anos. Os esforços empreendidos pelo acesso universal à prevenção, tratamento, atenção e apoio relacionados ao vírus da aids estão tirando a resposta à epidemia do isolamento. Desde 2001, ano que foi assinada a Declaração de Compromisso das Nações Unidas sobre HIV/Aids, o número de novas infecções na África Subsaariana diminuiu cerca de 15%, o que representa aproximadamente 400 mil infecções a menos em 2008. Na Ásia oriental, as novas infecções pelo HIV diminuíram quase 25% e na Ásia meridional e sub-oriental 10% durante o mesmo período.

4 - No Brasil, estima-se que 630 mil pessoas vivam hoje com HIV. Destes, cerca de 250 mil não conhecem seu status sorológico. Diversas ações no Sistema Único de Saúde estão sendo desenvolvidas para ampliação do acesso ao diagnóstico da infecção pelo HIV.

5 - A presença do vírus da aids no organismo é detectável com a realização de testes para o HIV, disponíveis no Sistema Único de Saúde. Inegavelmente, houve um aprimoramento na sensibilidade destes testes, contudo, deve-se considerar a existência da ‘janela imunológica’ (intervalo entre a infecção e a detecção de anticorpos anti-HIV no sangue) que, pode estender-se por mais de trinta dias, período esse sendo esse período de alto risco de transmissibilidade.

6 - Até o início de 1990, o diagnóstico para aids era considerado uma sentença de morte. Com a introdução da terapia antirretroviral de alta potência (TARV), aliada ao diagnóstico precoce e ao tratamento adequado, a aids tornou-se uma doença tratável e com características de cronicidade[3]. Atualmente cerca de 200 mil pessoas estão em uso de terapia anti-retroviral no país. Estudo recentemente realizado no Brasil[4] demonstra que o tempo de sobrevida de pacientes diagnosticados com aids vem apresentando um aumento substantivo.

7 - As pessoas em uso de TARV têm o risco geral de transmissão do HIV reduzido em 92%. Estudo realizado no período de um ano demonstrou que o risco de um indivíduo em tratamento transmitir o HIV, em relações heterossexuais, é de 0,46 para cada 100 pessoas e, na ausência de tratamento, é de 5,64, no mesmo período[5].

8 - No âmbito da política brasileira, ações de assistência e prevenção são integradas, e sendo a promoção ao uso do preservativo um dos métodos mais eficazes para a prevenção da transmissão do HIV, constitui importante recomendação do Ministério da Saúde para a adoção de práticas sexuais mais seguras. Para ampliar o acesso ao preservativo, o governo brasileiro tem distribuído cerca de 500 milhões de unidades por ano.

9 - Segundo pesquisa do Ministério da Saúde, 77% da população brasileira entre 15 e 64 anos é sexualmente ativa. Destas, 96% sabem que o preservativo é o método mais seguro para a prevenção ao HIV. Entretanto, somente 20,6% fizeram uso regular do preservativo em todas as relações sexuais, nos últimos 12 meses.

10 - O Ministério da Saúde tem trabalhado no desenvolvimento de novas estratégias de intervenção, focadas na co-responsabilidade, na orientação e aconselhamento em saúde sexual e reprodutiva do casal, que visam não somente a prevenção da transmissão do HIV, mas também, a prevenção de outras doenças sexualmente transmissíveis[6].

11 - Apesar dos avanços científicos e da ampliação do acesso à informação, prevenção, diagnóstico e tratamento, e do fato de todas as pessoas sexualmente ativas estarem potencialmente expostas ao HIV, independentemente de sexo, cor, orientação sexual ou profissão, a persistência do estigma e discriminação em relação às pessoas que vivem com HIV constitui sério obstáculo ao enfrentamento da epidemia.

12 - Em 1996, a ONU adotou as “Diretrizes Internacionais sobre HIV/aids e Direitos Humanos”[7] (E/CN.4/1997/37) e afirmou que “o respeito aos direitos humanos exige que as pessoas que vivem com HIV/aids não estejam submetidas a penalização ou outras medidas coercitivas, unicamente com base em seu status sorológico”.

13 - O Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais, fundamentado nos princípios do sigilo, da confidencialidade e dos direitos humanos, entende que processos que envolvam a criminalização da transmissão sexual do HIV podem desencadear decisões e entendimentos generalizados, comprometendo a resposta à epidemia.

Brasília, 27 de novembro de 2009.
Mariângela Batista Galvão Simão
Diretora
[1]. Criminalization of HIV Transmission. Policy Brief, 2008. http://data.unaids.org/pub/BaseDocument/2008/20080731_jc1513_policy_criminalization_en.pdf.
[2]. Situação da Epidemia da Aids, 2009. http://www.unaids.org
[3]. Recomendações para terapia Antirretroviral em Adultos Infectados pelo HIV,2008. Ministério da Saúde, Brasil.
[4]. Guibu IA, Barros MBA, Cordeiro MRD et al. Estudo de Sobrevida de Pacientes de Aids no Brasil, Fase I - 1998-1999 - Região Sul e Sudeste. In Boletim Epidemiológico DST/AIDS, ano V, no 01 - 27ª à 52ª semanas epidemiológicas – julho a dezembro de 2007 e 01ª à 26ª semanas epidemiológicas – janeiro a junho de 2008. Ministério da Saúde. SVS. PN DST- AIDS. ISSN 1517 1159.
[5]. Attia S, Eggera M, Müller M et al., 2009. Sexual transmission of HIV according to viral load and antiretroviral therapy: systematic review and meta-analysis. AIDS, 23 (11): 1397-1404.
[6]. Ministério da Saúde. Prevenção Posithiva. Brasília, 2007.
[7]. International Guidelines on HIV/AIDS and Human Rights, 2006. Consolidated Version. http://data.unaids.org/Publications/IRC-pub07/jc1252-internguidelines_en.pdf

 

Materiais impressos relacionados ao projeto

Previd. e Exclusão
Crimin. e Exclusão
Poster do projeto
Folder Previdência
Folder Criminaliz.
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