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OMS aceita proposta do Brasil
28/05/2003 - O ESTADO DE SÃO PAULO
País teve de ceder, mas EUA queriam restringir tema à OMS.
País teve de ceder, mas EUA queriam restringir tema à Organização Mundial do Comércio
JAMIL CHADE
Correspondente
GENEBRA - Depois de vários dias de intensos debates em Genebra, a Organização Mundial da Saúde (OMS) aprovou ontem uma resolução proposta pelo Brasil para que a entidade promova uma avaliação do impacto das patentes de medicamentos nos sistemas de saúde de todo o mundo e para que se garanta a transferência de tecnologia entre os países desenvolvidos e em desenvolvimento.
A proposta original, porém, teve de ser amenizada diante da pressão dos Estados Unidos, que sequer queriam que o tema estivesse na agenda da OMS.
"Todos tiveram que ceder, inclusive os autores da proposta", afirmou uma diplomata americana, em referência às mudanças que o Brasil teve de realizar no texto final.
Para o diretor da Escola Nacional de Saúde Pública da Fiocruz, Jorge Bermudez, o Brasil foi o "grande vencedor" nessas negociações. "Conseguimos um mandato para que a OMS trabalhe em questões de propriedade intelectual que afetam a saúde pública", afirmou o principal negociador do País. Segundo ele, o setor de genéricos também sai fortalecido diante do comprometimento de que ocorra uma transferência de tecnologia.
Segundo a versão final da resolução, a OMS deverá constituir um grupo para coletar dados e avaliar se as patentes a remédios ferem o direito das populações de ter acesso a tratamentos. Mas na versão original da proposta brasileira, o País pedia a criação de um comitê que tivesse essa função.
Pela resolução, o caráter "independente" da comissão foi retirado do texto por exigência dos Estados Unidos.
O segundo ponto que exigiu flexibilidade do Brasil foi em relação a uma eventual função da OMS de monitorar tratados comerciais regionais e bilaterais para que não desrespeitem o direito ao acesso aos medicamentos.
Um dos temores do governo brasileiro é de que, com a criação da Área de Livre Comércio das Américas (Alca), Washington pretenda fortalecer a defesa das patentes no âmbito regional.
No texto aprovado ontem, o Brasil foi obrigado a se contentar com a referência a "tratados comerciais", sem qualquer indicação se esses acordos se referem às negociações regionais ou à Organização Mundial do Comércio (OMC).
Mas os Estados Unidos também tiveram de abandonar suas idéias iniciais.
Washington propunha que qualquer tema referente às patentes fosse tratado pela OMC e pela Organização Mundial da Propriedade Intelectual. A proposta não contou com um apoio significativo, enquanto o Brasil já possuía a promessa de votos de mais de 70 países.
Aids - A indicação do especialista brasileiro Paulo Teixeira para formular a nova política de aids da OMS causou reação negativa da Casa Branca. Segundo altos funcionários da agência, o governo americano deixou claro ao diretor eleito da OMS, Jong Wook Lee, que não ficou satisfeito com a escolha do brasileiro. Washington pretende indicar um nome para fazer parte da equipe.
Teixeira foi indicado na semana passada para ocupar o cargo na OMS com o objetivo de ampliar em escala global a experiência brasileira de combate a aids. Entre vários aspectos, a política incluiria garantir remédios baratos aos governos mais pobres.
Para os EUA, o temor é de que essa iniciativa inclua a pressão para que as empresas garantam remédios a preços mais baixos ou para que seja dada maior atenção ao desenvolvimento de produtores de genéricos. Além disso, teme-se que os governos se sintam fortalecidos para quebrar patentes de remédios.
Representantes do presidente George W. Bush afirmaram que, de fato, "Paulo Teixeira e o governo dos EUA têm visões diferentes do mundo". A atual diretora da OMS, Gro Harlem Brundtland, disse não acreditar que a proposta de distribuição de medicamentos para países pobres seja viável.