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Entrevista com Paulo Teixeira

21/05/2003 - O GLOBO

‘Queremos ampliar o tratamento’

Roberta Jansen

O coordenador do programa brasileiro de Aids, Paulo Teixeira, irá dirigir a elaboração do plano da Organização Mundial de Saúde (OMS) para o combate à doença. O projeto será apresentado no dia 21 de julho, quando toma posse o novo diretor da instituição, Jong Wook Lee. Teixeira está em Genebra, participando da Assembléia Geral da OMS, de onde deu entrevista por telefone ao GLOBO. “Queremos ampliar o acesso ao tratamento”, disse.

Quando o senhor deverá apresentar a nova proposta para o programa de Aids da OMS?

PAULO TEIXEIRA: Nós temos um prazo até meados de julho para a elaboração deste plano. Estarei aqui na qualidade de representante do Ministério da Saúde. Foi feito um pedido ao ministro (Humberto Costa) para indicar alguém para coordenar o processo de transição e para formular um projeto para os próximos cinco anos.

O convite significa um reconhecimento do programa brasileiro. A experiência do Brasil servirá de base para um plano mundial?

TEIXEIRA: O significado disso é efetivamente que a experiência brasileira será utilizada para a elaboração da estratégia da OMS. Nossa idéia é usar a experiência do Brasil, e também de outros países, para elaborar um projeto mais contundente, que leve em conta principalmente a ampliação do acesso ao tratamento. Hoje, em todo o mundo, cerca de 500 mil pessoas tomam os antiretrovirais. Desse total, 30% estão no Brasil.

Como será o novo programa? O senhor poderia adiantar alguns pontos?

TEIXEIRA: Trata-se de uma nova proposta mundial para a luta contra a Aids, englobando prevenção, tratamento e direitos humanos. A maior urgência é para o tratamento. Queremos fazer um projeto viável, que permita alterar dramaticamente a situação num período curto de tempo, no máximo em dois anos. É difícil estabelecer metas agora, mas queremos ter alguns milhões seguindo o tratamento. Posso dizer que vamos usar como referência no trabalho uma meta da própria diretoria da OMS: incluir três milhões no tratamento nos próximos dois anos.

O programa brasileiro se mostrou viável porque houve um comprometimento do governo e uma forte participação da sociedade civil. Em muitos países atingidos pela doença, sobretudo na África, muitas vezes não há condições financeiras ou vontade política para enfrentar o problema. Como superar isso?

TEIXEIRA: Envolver, sensibilizar e mobilizar é uma tarefa nossa também. Vamos traçar estratégias para trabalhar com os governos e com a opinião pública internacional. Também é importante o envolvimento das comunidades, que têm uma força tremenda, como mostra a experiência brasileira. Nos momentos mais críticos, a atuação das ONGs foi fundamental. Seguiremos envolvidos também na mobilização de verbas para o fundo mundial e na parceria com instituições, como o Banco Mundial, para tentar cobrir todas as possibilidades em termos de mobilização para provocar mudanças.

Uma das características fundamentais do programa brasileiro é a produção de medicamentos genéricos. O governo já ameaçou inclusive quebrar patentes, numa postura que desafia laboratórios farmacêuticos. O plano da OMS terá essas diretrizes?

TEIXEIRA: Estamos agora num período de transição, de elaboração e apresentação das propostas a serem aprovadas pelo diretor-geral. A minha experiência é a brasileira e vou usá-la na elaboração do projeto da OMS, mas, evidentemente, caberá ao diretor aceitá-la de maneira completa. Mas, sim, é uma marca do programa brasileiro mobilizar todos os mecanismos para tornar o acesso aos medicamentos viável, seja na produção, no controle de qualidade ou na quebra de patentes.

O senhor está deixando o programa brasileiro?

TEIXEIRA: Em princípio, não. O compromisso foi com a transição. Eventualmente pode haver um convite formal, mas, no momento, não vim como convidado.