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MEDICAMENTOS VIA JUSTIÇA
01/04/2009 - www.conjur.com.br
Demora na inclusão leva demanda ao Judiciário
A judicialização do direito à saúde refere-se à obtenção de atendimento médico, medicamentoso e de procedimentos diagnósticos por via judicial. Em artigo publicado em 7/8/2008, posicionei-me sobre o fornecimento de medicamentos novos e caros por essa mesma via. A ausência de eficácia ou a omissão do Estado na prestação da assistência em certos casos específicos deu origem à intervenção do Poder Judiciário em prol da efetivação da assistência recomendada nos casos indicados pelos médicos. Esta se faz por meio de liminares concedidas por instâncias da magistratura obrigando o Estado a fornecer gratuitamente remédios de alto custo que não constam da lista do Sistema Único de Saúde (SUS).
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A origem deste problema começa, a meu ver, exatamente aí: novos medicamentos (alguns não necessariamente tão novos) ou procedimentos de auxílio no controle de certas doenças como é o caso das patologias autoimunes demoram anos ou décadas para ser incluídos na lista do SUS. Milhares de brasileiros são prejudicados pela não-inclusão no sistema de novos recursos de diagnóstico ou de terapêutica.
Psoríase é uma doença de pele que acomete mais de cinco milhões de brasileiros em suas diversas fases. Espondilite anquilosante, uma enfermidade reumática que provoca dores e inflamação na coluna vertebral, afeta em torno de 700 mil brasileiros. Consultas públicas para inclusão de medicamentos de alta eficácia no combate a essas doenças foram feitas pela Secretaria de Ciência Tecnologia e Insumos Estratégicos do Ministério da Saúde no segundo semestre de 2004 e, passados mais de quatro anos, não há uma decisão.
Nada justifica esse atraso. Ele só leva cada vez mais e mais pacientes a solicitarem ao Judiciário o acesso aos novos remédios. Isso, no entanto, não parece ocorrer com outras enfermidades, como é o caso da aids. Estimam-se aproximadamente 500 mil portadores da doença no país e num pequeno número de casos ocorre resistência aos tratamentos disponíveis no mercado. Para estes, em tempo recorde, foi incluído pelo Ministério da Saúde um novo antirretroviral (Raltegravir) na lista de distribuição gratuita do SUS.
Procedimentos diagnósticos rapidamente incorporados à prática clínica por sua eficácia também não são absorvidos pelo sistema público com a rapidez necessária. Um teste altamente específico para o diagnóstico de artrite reumatoide foi introduzido mundialmente em 2000. A pesquisa dando crédito ao pioneirismo dos brasileiros que utilizaram essa metodologia foi publicada em 2003 numa das melhores revistas da área, a Annals of Internal Medicine. Estamos, no entanto, a nove anos de sua descoberta e o SUS ainda não tomou conhecimento do valor desse teste para portadores dessa enfermidade.
As autoridades alegam que com os recursos que têm sido dirigidos ao cumprimento de decisões judiciais seria possível construir novos hospitais, beneficiando-se, assim, um número maior de pessoas. Tal hierarquia numérica de possíveis benefícios à população em casos de maiores custos sinaliza que em política pública de saúde estes devem ficar ao acaso. A morosidade pública, a meu ver, é o maior estímulo à judicialização, criando-se uma nova indústria entre médicos, laboratórios e advogados.
A inclusão de novos medicamentos deve necessariamente passar pela consulta às respectivas sociedades médicas e à organização representativa dos pacientes portadores das diversas enfermidades. O impacto econômico de alguns medicamentos que são vistos, a princípio, como caros pode representar, no controle de doenças autoimunes, algo muito favorável não só para o paciente, mas também para os cofres públicos. Muitos desses medicamentos têm-se mostrado altamente eficientes. No uso precoce, alguns desses produtos sinalizam para a cura com suspensão do uso de medicamentos. As autoridades governamentais sabem e conseguem criar mecanismos de regulação ao uso de novos medicamentos de eficácia comprovada, utilizando para custear o processo recursos originários da arrecadação dos impostos. Ignorar os avanços tecnológicos não é aceitável do ponto de vista ético e científico.
Não se espera, contudo, que qualquer novidade de mercado seja incorporada à lista gratuita, pois os progressos tecnológicos devem tornar cada vez mais frequentes as inovações terapêuticas.
Outra doença autoimune conhecida, como a esclerodermia, pode provocar em certas situações feridas na pele, com dores excruciantes. Recentemente, um paciente sob meus cuidados obteve por via judicial um medicamento de alto custo, com grande sucesso detalhes deste caso estão publicados na revista Annals of Rheumatic Diseases. Seguindo o raciocínio de alguns gestores públicos, uma alternativa mais barata deveria ser usada, mesmo que isso não tenha nada que ver com a eficácia clínica. A indicação do medicamento em questão para seu uso no tratamento de feridas de pele dolorosas e refratárias foi aprovada pela agência europeia de medicamentos no início de 2007 e se encontra em análise pelas autoridades governamentais brasileiras desde julho do mesmo ano.
Comemoramos em 2008 os 20 anos da criação do SUS e do direito constitucional à saúde, mas no que concerne ao acesso a novas tecnologias e medicamentos não há muito o que comemorar. Existe uma excessiva lentidão na incorporação de avanços médicos pelo SUS, inaceitável em certos casos. No meu entender, a judicialização se torna um mal necessário.
Por Morton Scheinberg[Artigo publicado originalmente no jornal O Estado de S. Paulo, desta segunda-feira (23/2)]
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