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PROCURADOR GERAL ALERTA LULA
23/10/2003 - O ESTADO DE SÃO PAULO
Fonteles "sugere" que Lula devolva R$ 4 bi à saúde
Ofício, na prática, adverte que governo pode ser contestado e derrotado se ferir Constituição
BRASÍLIA - Um ofício encaminhado ontem pelo procurador-geral da República, Cláudio Lemos Fonteles, ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, recomenda que o Executivo envie "em tempo hábil" nova emenda à proposta orçamentária de 2004, no valor de R$ 4,020 bilhões para garantir a integralidade dos recursos para o Ministério da Saúde no Orçamento de 2004.
Na prática, é um alerta ao Planalto de que ele poderá ser contestado e derrotado na Justiça, por estar ferindo a Constituição ao incluir como despesas de saúde os custos de atividades do Fundo de Combate à Pobreza.
Apesar dessa iniciativa e das pressões que continuam crescendo no Congresso, com manifestações no plenário da Câmara, o ministro do Planejamento, Guido Mantega, voltou a afirmar ontem, por meio de sua assessoria, que a proposta do governo está dentro da lei e que o chefe do Ministério Público fez "apenas uma recomendação".
No início da noite, o ministro da Saúde, Humberto Costa, foi conversar com Mantega para tentar encontrar uma solução para o impasse. "O governo está abrindo um processo de negociação porque tem o objetivo de garantir recursos para todos os programas sociais, inclusive de transferência de renda, sem prejuízo de qualquer outra área, inclusive a área da saúde. A área da saúde não será prejudicada", disse Costa, antes de se reunir com o ministro do Planejamento. Fonteles também esteve ontem com Mantega, mas preferiu não dar entrevista e a assessoria de Mantega informou que a conversa foi sobre o Orçamento da Procuradoria dentro do Plano Plurianual.
"Vitória" - Para o deputado Roberto Gouveia (PT-SP), um dos autores da notificação à Procuradoria Geral da República contra a manobra feita pelo governo no orçamento da Saúde, a recomendação de Fonteles é um "sinal de vitória". "A recomendação mostra que eu estou certo e como um deputado da base aliada estou ajudando o meu governo. Tenho certeza de que o governo vai voltar atrás", disse o petista. "Afinal, a posição do presidente Lula é realizar o Fome Zero sem prejudicar a saúde", concluiu.
Na prática, a recomendação de Fonteles ao presidente Lula não tem efeito jurídico, mas serve de alerta ao Palácio do Planalto de que, num julgamento do assunto pelo Supremo Tribunal Federal, o governo poderá vir a ser derrotado na Justiça. Dos R$ 32,481 bilhões que o governo precisa gastar no ano que vem em ações e serviços públicos de saúde, de acordo com o piso constitucional previsto na Emenda Constitucional número 29, R$ 3,571 bilhões foram preenchidos com programas de caráter assistencial - Bolsa Alimentação e saneamento básico - financiados pelo Fundo de Combate e Erradicação da Pobreza.
No ofício, Fonteles recomenda a recomposição de R$ 4,020 bilhões no orçamento da Saúde de 2004 sob a alegação de que, além dos R$ 3,571 bilhões do Fundo da Pobreza, são necessários mais R$ 449 milhões para que seja atendido o mínimo exigido pela Emenda 29. Segundo o procurador, a proposta orçamentária do ano que vem deveria destinar R$ 32,930 bilhões para a área de Saúde e não os R$ 32,481 bilhões previstos.
A diferença, de acordo com o ofício do procurador-geral, deve-se ao fato de a proposta orçamentária prever a incidência da variação do Produto Interno Bruto sobre o valor a ser aplicado em 2003 - R$ 27,240 bilhões - e não sobre o mínimo constitucional de R$ 27,617 bilhões que deveria ter sido aplicado.
A pressão dos parlamentares para recompor as verbas da Saúde é grande e o relator da proposta orçamentária de 2004, deputado Jorge Bittar (PT-RJ), estuda uma fórmula para refazer o orçamento da área. Mas o petista já disse que não tem "uma varinha mágica" para resolver esse problema e fazer os recursos aparecerem. "Vamos procurar equacionar essa problema e vamos ter uma atenção especial para a Saúde e ver se conseguimos recursos adicionais", tem repetido o relator. Uma saída que poderá ser utilizada pelos governistas na discussão do orçamento, segundo o deputado Sérgio Miranda (PC do B-MG), é a destinação de um terço das emendas dos parlamentares para a Saúde, o que daria R$ 1 bilhão de recursos a mais para a área. Outra alternativa: o governo retiraria os recursos para saneamento básico previstos no orçamento do Ministério das Cidades e os passaria à Saúde.