Notícias

A AIDS EM SAN FRANCISCO (EUA)

10/08/2006 - AFP

San Francisco: do desespero à convivência com o vírus da Aids

Há 25 anos, uma doença misteriosa que logo seria conhecida como Aids deixava a marca da morte na cidade de San Francisco, na costa oeste americana.
Subitamente, o sexo desenfreado das saunas deu lugar ao terror, à afluência de doentes aos hospitais e às mortes, que deixaram desamparados amigos e amantes das vítimas da "praga gay".
"Era uma loucura", lembra Richard Broussard, de 44 anos, soropositivo há 20. "Você ia a um enterro e todos estavam aterrorizados".
Os que apresentavam os sintomas do flagelo eram rejeitados nos aviões, enquanto as agências funerárias se recusavam a preparar os corpos dos mortos pela doença, emenda Jason Riggs, porta-voz do projeto "Stop AIDS".
"Naquela época, as pessoas falavam em quarentena. Era uma época espantosa. A sociedade fechou fileiras contra os homens infectados com a doença", acrescenta.
Broussard demorou um ano para encontrar um dentista que aceitasse tratá-lo e que acabou atendendo-o às três da madrugada para não despertar suspeitas entre os outros pacientes.
Eric Goosby lembra que, quando era um jovem residente no Hospital Geral de San Francisco, via camas abarrotadas de jovens com sintomas semelhantes aos da pneumonia.
"Ignorávamos o que estávamos enfrentando. Avançávamos às cegas. Os hospitais estavam lotados", diz Goosby, que hoje dirige a "Pangaea Global AIDS Foundation".
Segundo ele, naquele momento, cerca de 80% dos pacientes estavam infectados com o vírus e o pessoal temia se contaminar.
Em 1983, quase a metade dos moradores do famoso "bairro gay" de Castro era de soropositivos, segundo vários estudos.
"Em termos gerais, os homossexuais morriam em todas as partes, sem a menor ajuda do governo", resume Riggs.
Foi neste clima, em 1984, que se implantou o projeto "Stop AIDS". "Você via seus amigos e amantes morrerem", explica Goosby. "Tudo indicava que algo estava mal e que era preciso corrigi-lo".
As saunas foram fechadas e apareceram pela primeira vez mensagens promovendo a proteção.
Em 1994, um novo medicamento trouxe um certo alívio. "Os inibidores de protease são como uma pequena bomba que se lança sobre o vírus, matando-o", explica Goosby. "Muitas pessoas que estavam voltadas a pensar a que dedicariam seus últimos anos de vida, de repente deram com a idéia de que não iam morrer", acrescenta.
A expectativa de vida de um soropositivo passou de 12 para 20 anos e depois a 30. Em San Francisco, o contágio diminuiu. No entanto, o vírus continua existindo.
Ao mesmo tempo, a retomada do sexo sem proteção e de "discursos irresponsáveis" sobre o fim da doença levaram à retomada dos contágios no fim dos anos 1990, segundo Riggs, enquanto nos últimos seis anos se acentuou o consumo da "crystal meth", uma droga que favorece comportamentos de risco.
No entanto, a comunidade gay continua em recuperação: há 25 anos, um homossexual ou bissexual em cada cinco se infectava anualmente, enquanto segundo estatísticas recentes, menos de 2% desta população serão contaminadas em 2006.
No ano passado, Richard Broussard ouviu seu médico dizer que tinha mais chances de morrer em um acidente de trânsito que por causa da Aids. "Tudo parece tão diferente", diz, antes de assistir ao evento "Boas-vindas aos soropositivos".
"É como uma doença cardíaca ou diabetes", garante o organizador do encontro, Eric Ghramm, de 28 anos, soropositivo há quatro. "Você precisa se cuidar, mas não tem mais que se trancar em um poço".