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SEMINÁRIO GIV E LPV

20/03/2006 - Agência Aids

"A universidade e o hiv/aids"

“O Tratamento e seus impactos” foi o tema abordado na segunda mesa do seminário “Universidade e o HIV/Aids”, realizado pelo Grupo de Incentivo à Vida (GIV) e pelo grupo “Lutando pela Vida”, neste sábado, 18, no Centro Universitário Maria Antonia da USP, em São Paulo. Sob a coordenação do integrante do GIV e membro do Comitê Nacional de Vacinas, Jorge Belóqui, a mesa teve a participação do médico infectologista e e professor associado do Depto. de Moléstias Infecciosas e Parasitárias da Faculdade de Medicina da USP, Dr. Aluísio Segurado; do diretor do Instituto de Saúde de São Paulo, Alexandre Grangeiro; e da advogada da Associação Brasileira Interdisciplinar de Aids (ABIA), Miriam Ventura.

Falando sobre os “Aspectos Médicos Sociais”, o Dr. Aluísio Segurado ressaltou que “a responsabilidade dos educandos não é só no sentido cognitivo, mas também da formação ética do jovem, da sua formação como cidadão.” Segurado destacou o pioneirismo do Brasil, desde o começo da epidemia, de aliar ações de assistência e prevenção, ressaltando as particularidades da resposta brasileira, que teve início em um momento histórico de grande mobilização social pela redemocratização do país, tendo como características a inter-setorialidade e a parceria governo/sociedade civil, sempre alicerçada em sólidas bases jurídicas.

O infectologista enfatizou que os benefícios do tratamento e cuidado integral não foram uniformes em todos os setores e que com as novas conquistas vieram novas demandas e novos desafios. “As mulheres estão chegando aos serviços em estágios mais precoces da doença, mas apesar de terem o mesmo acesso que os homens ao tratamento, a taxa de mortalidade entre elas é mais alta,” enfatizou. Segundo ele, faltam ações programáticas voltadas para os homens que fazem sexo com mulheres e que, em relação aos jovens, o tratamento acaba sendo um obstáculo à integração social do indivíduo, que teme o preconceito com a revelação do seu diagnóstico, o que traz conseqüências desastrosas do ponto de vista psico-social.Outro desafio aventado por Segurado são as co-infecções. “O aumento da sobre-vida trouxe a manifestação das co-infecções e está mudando o perfil da mortalidade entre os portadores do HIV. O índice de co-infecção com o vírus da Hepatite C é de 15% na universidade, no CRT de Santos, é de 30% e entre os usuários de drogas injetáveis (UDI) pode chegar a 80%”, alerta ele. Entre os eventos adversos do tratamento citados por ele ainda estão a lipodistrofia (alteração da distribuição de gordura no corpo) e alterações metabólicas como o aumento do colesterol e das triglicérides, o que pode acarretar no surgimento de doenças cardio-vasculares.

Como o Estado se articula para organizar os sistemas e serviços de saúde para atender as demandas da sociedade, foi o tema exposto por Alexandre Grangeiro, que falou sobre “Ações Pragmáticas”. O diretor do Instituto de Saúde de São Paulo destacou que os dados positivos como a redução da mortalidade, o acesso universal e a melhoria da qualidade de vida dos soropositivos, podem esconder problemas não resolvidos da resposta brasileira à epidemia. “Os resultados se distribuem de maneira homogênea entre os setores da sociedade e entre os diversos estados brasileiros? A resposta é não,” afirmou.

Grangeiro informou que as regiões com maior índice de desenvolvimento tem dificuldades menores. “Em alguns estados brasileiros, as pessoas morrem em função da desigualdade social e não em decorrência do vírus. São mortes evitáveis, não é necessário descobrir novos tratamentos ou vacinas para evitá-las”, enfatizou. Ele acrescenta que o aumento da demanda causou uma piora no atendimento, causando filas de espera, demora para realização de exames e escassez de insumos. Entre as alternativas citadas por ele para reverter a situação estão a volta do crescimento econômico do país, para que possa haver mais investimentos na área de saúde; adotar políticas que levem à redução dos custos do tratamento, sem que isso signifique um obstáculo ao acesso do mesmo; e uma política mais clara para garantir o desenvolvimento tecnológico no país.

Em sua análise dos “Aspectos Jurídicos”, Miriam Ventura sugeriu duas reflexões: 1) à medida que avançamos em liberdades individuais, mais nos submetemos ao poder soberano; 2) cultura vigente x cultura dos limites – temos limitações e não podemos atender todas as demandas. Ventura criticou o fato da justiça estar atrelada ao diagnóstico médico. “A medicina faz o diagnóstico e a justiça dá o hábeas corpus”, disse. A advogada destacou que o movimento de Aids trouxe para a discussão questões antes restritas, como a sexualidade. “Há algum tempo atrás havia ações que condenavam escolas e professores por abordar questões de sexualidade. O movimento social se instrumentalizou de dispositivos jurídicos e avançou nas conquistas, como o acesso aos medicamentos, a conquista de direitos civis sociais e as novas interpretações dos costumes e das práticas sociais”, enfatizou.

Jorge Belóqui encerrou a segunda mesa do dia levantando algumas problemas. “Em fevereiro do ano passado tivemos falta de anti-retrovirais, estão fechando a enfermaria do Hospital Emílio Ribas sob pretexto de se fazer uma reforma e a Casa da Aids reduziu pessoal e o número de pessoas atendidas”, denunciou. “Temos um ministro da Saúde que, para justificar seu entendimento com a indústria farmacêutica e não decretar o licenciamento compulsório do Kaletra, disse que a Aids estava controlada no Brasil, onde a epidemia mata 11 mil pessoas por ano. É como se todos os dias, um ônibus caísse em uma ribanceira e matasse os 30 passageiros. A diferença é que não sai nos jornais”, criticou.

Maurício Barreira