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O DIREITO DO BRASIL SALVAR VIDAS

23/06/2005 - Agência Aids

Editorial do New York Times

O jornal norte-americano The New York Times publicou nesta quinta-feira, 23, um editorial intitulado “O direito do Brasil de salvar vidas”, que defende a quebra de patentes dos remédios anti-retrovirais e aconselha um comprometimento por parte dos Estados Unidos em não aplicar retaliações comerciais ao Brasil
O editorial trouxe satisfação ao Programa Nacional de DST/Aids. Segundo seu diretor-adjunto, Dr.Ricardo Pio Marins, o autor teve lucidez e questionou de maneira clara a questão das patentes, colocando a importância da experiência brasileira para os outros países do mundo. Segundo Marins, é a visão de uma pessoa que sabe que a propriedade intelectual tem o seu valor, mas tem que ser adequada quando a questão é a saúde pública. “Não é possível manter uma política comercial protecionista quando o que está em jogo é a saúde das pessoas. O editorial estimula a sociedade mundial a pensar nessa questão e é importante que haja um questionamento interno dos Estados Unidos sobre o comportamento de sua política externa, que pode causar danos à saúde mundial. O Brasil conta com pessoas e autoridades no mundo que tenham essa lucidez e saibam que essa é uma questão muito importante,” acrescentou.
O presidente do Fórum de ONG/Aids do Estado de São Paulo, Rubens de Oliveira Duda, afirmou que a questão de quebra de patentes do Brasil está sendo repercutida cada dia mais nas esferas internacionais, mas há uma contradição muito grande nesse discurso todo. “Os laboratórios internacionais dizem que os laboratórios nacionais não têm capacidade e nem tecnologia suficiente para produzir os medicamentos como eles devem ser. Já os nacionais alegam que têm, sim, a capacidade e tecnologia necessária para a produção dos remédios,” questionou Duda, que acredita que o editorial pode ajudar a sensibilizar os deputados e senadores na aprovação do projeto de lei nº 22/03, do deputado Roberto Gouveia.“O texto publicado pelo jornal norte-americano é muito positivo, mas perante essa questão, ainda nos deixa muito inseguros quanto às reais decisões. Nós queremos uma posição definitiva", desabafou.
O diretor de comunicação da Merck Sharp & Dohme, João Sanches, acredita que a discussão da quebra de patentes não é sobre salvar vidas e que não é isso que vai resolver o problema de orçamento do Programa Nacional de DST/Aids. “Hoje, a vida das pessoas que vivem com HIV/Aids estão sendo salvas por causa das indústrias farmacêuticas. Nós é que descobrimos os medicamentos e somos os primeiros a dizer isso. Basicamente, a Merck tem feito isso”, declarou. Sanches ressaltou que ass regras da Organização Mundial do Comércio flexibilizam a lei de patentes para casos de emergência nacional e o que o Brasil vive em relação a Aids não é uma emergência nacional, mas sim um problema sanitário, o que é diferente. “Os gastos do programa nacional com ARV representam 32% do seu orçamento. Não é uma questão de emergência nacional”, acrescentou.
Sanches citou dados apresentados pelo diretor do Programa Nacional de DST/Aids em uma reunião da Organização Mundial de Saúde em março passado que mostram que o Brasil gastou R$ 622 milhões em 1999 para tratar 78 mil pessoas, ao passo que em 2004 foram gastos R$ 570 milhões para tratar 154 mil pessoas. “É óbvio que o número de pessoas vivendo com HIV/Aids vai aumentar. O tratamento com ARV evitou 90 mil mortes, os pacientes vivem mais e novas infecções vão acontecendo. A tendência é que o número de soropositivos cresça. A longo prazo, querer tratar cada vez mais pacientes com menos dinheiro é utopia,” declarou. Sanches ainda afirmou que o Programa Nacional não terá sustentabilidade somente com a redução dos preços dos medicamentos e que a sociedade civil tem que exigir que o governo invista mais. “Nós estamos salvando vidas e melhoramos o acesso. Reduzimos o preço dos medicamentos em 80%. O preço no Brasil corresponde a 10% do valor cobrado nos Estados Unidos”, completou.
A assessoria de imprensa dos laboratórios Abbott declarou que chegou recentemente a um acordo de preço com o Ministério da Saúde para garantir que os pacientes brasileiros que vivem com HIV/Aids tenham acesso ao Kaletra (lopinovi/ritonavir). “Por este acordo, o Brasil continuará a receber Kaletra pelo preço mais baixo do mundo fora do programa de preço humanitário da companhia para a Àfrica e países menos desenvolvidos, conforme designação das Nações Unidas (países africanos recebem os medicamentos da Abbott para HIV a ‘fundo perdido’ - sem lucro). O Brasil também recebe, como parte do acordo com a Abbott, a doação de Kaletra solução oral para o tratamento de crianças infectadas com o vírus HIV", diz o texto enviado à Agência de Notícias da Aids pela assessoria do laboratório.
O diretor do departamento de ativismo do Grupo de Apoio e Prevenção à Aids (GAPA) de Ribeirão Preto, Alcebíades Francisco da Costa Jr., considera positivo o fato dos donos dos royalties (os norte-americanos) se declarem favoráveis à quebra de patentes, mas não acha isso absurdo, porque está previsto em acordos internacionais e nas normas da Organização Mundial de Saúde. “O importante é garantir o acesso aos medicamentos e quebrar as patentes não é a única estratégia para chegar a este objetivo. Cabe ao governo escolher a melhor estratégia e não à sociedade civil. O Brasil tem 18 mil novas infecções a cada ano e o orçamento do Programa Nacional continua o mesmo já há algum tempo. O aumento dos recursos também é uma estratégia”, concluiu.