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CHEQUE CAUÇÃO

01/06/2005 - Revista Consultor Jur[idi

Perito do INSS é condenado por fraude em benefícios

O médico Paschoal Mazzuca Neto, perito do INSS — Instituto Nacional de Seguridade Social foi condenado à perda do cargo público, dos direitos políticos por oito anos e a devolver os valores recebidos ilicitamente de servidores que buscavam benefícios previdenciários em seu consultório. A decisão é do juiz Roberto Lemos dos Santos Filho, da 1ª Vara da Justiça Federal de Bauru, em São Paulo. Cabe recurso.
De acordo com denúncia do Ministério Público Federal, Mazzuca Neto solicitava folhas de cheques em branco como garantia de pagamento pela ajuda na concessão de benefícios irregulares. De cada segurado ele recebia 30% do valor total do benefício recebido.
Em mandado de busca no consultório do médico, o MP apreendeu diversos cheques de segurados, preenchidos ou assinados em branco e fichas de acompanhamento. A denúncia trouxe uma amostragem de 26 procedimentos periciais efetivados pelo médico e concluiu que em 16 deles os segurados que recebiam os benefícios estavam habilitados para retornar ao trabalho.
Em sua defesa, o médico sustentou jamais ter exigido cheques pós-datados de beneficiários do INSS e que o procedimento somente era adotado com pacientes particulares, como meio de garantir o retorno deles à nova consulta. Afirmou, ainda, que somente opinava pela concessão do benefício quando verificava incapacidade do trabalhador, acreditando ser vítima de complô do Sindicato dos Bancários.
O juiz Santos Filho, no entanto, acatou os argumentos do Ministério Público. Segundo o órgão, o médico não foi leal à instituição que serve, manteve conduta incompatível com a moralidade administrativa, valeu-se de seu cargo para garantir proveito próprio e a terceiros, em detrimento da função pública, e cometeu improbidade administrativa.
O médico também foi condenado ao pagamento de multa, proibido de contratar com o Poder Público por 10 anos e arcar com indenização por danos morais causados à coletividade no valor correspondente a vinte vezes o valor atribuído à causa.

Leia a íntegra da sentença

Autos nº 2000.61.08.008427-9

1ª Vara Justiça Federal Bauru/SP

Vistos.

MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL propôs a presente ação em face de PASCHOAL MAZZUCA NETO, visando a apuração de atos de improbidade administrativa especificados, bem como a aplicação de sanções civis e políticas, e o ressarcimento de danos morais decorrentes de imputados atos não conformes à probidade administrativa, fundamentando o pedido nas previsões contidas nos arts. 9º, caput, e inciso I, combinado com o art. 12, inciso I, c.c. os arts 1º, 2º e 21, inciso I, todos da Lei nº 8.429/1992.
Segundo a inicial, o réu exercia atividades de médico perito do quadro permanente do INSS, especificamente no grupamento médico pericial do Posto do Seguro Social em Bauru/SP e, de acordo com o apurado nos autos da ação penal nº 1999.61.08.006600-5 que tramita perante a 2ª Vara desta Subseção da Justiça Federal, valendo-se de sua qualidade de médico perito do INSS, solicitou a vários pacientes-segurados folhas de cheques em branco para posterior preenchimento e saque, como meio de obterem afastamento de suas ocupações profissionais.
O Ministério Público Federal tomou conhecimento das ocorrências em razão de denúncia feita por um dos segurados lesados, e intentou medida judicial visando a busca e apreensão de documentos que estivessem em poder do réu. Concedida liminar, foi realizada diligência no escritório pessoal do demandado, quando apreendida agenda pessoal onde registrados dados de vários segurados. Também foram apreendidos diversos cheques de segurados, preenchidos e/ou assinados em branco, e fichas de acompanhamento de pacientes-segurados.
Com base nos dados constantes da documentação apreendida por força da medida deferida nos autos da ação de busca e apreensão distribuída à 2ª Vara desta, foram realizadas a identificação, a localização e a oitiva de vários beneficiários da Previdência Social, ações essas que permitiram a conclusão de ter o réu, por diversas vezes, se valido da condição de médico-perito do INSS para, sob promessa de favorecer interesses perante a Administração Pública, solicitar e receber para si vantagens indevidas.
Narra a inicial que foi apurada efetiva percepção de vantagem patrimonial indevida, restando caracterizados os requisitos exigidos para a configuração de ato de improbidade administrativa (art. 9º, inciso I, da Lei nº 8.429/1992), a merecer a reprimenda do art. 12, inciso I, da Lei nº 8.429/1992 e, eventualmente, a sanção do art. 134 da Lei nº 8.112/1990. Em aditamento apresentado às fls. 108/109 foi postulada a condenação do réu ao ressarcimento dos danos morais causados em valor a ser fixado em momento oportuno.
Regularmente citado (fl. 120), o demandado apresentou resposta às fls. 122/135, argüindo preliminares de incapacidade do Ministério Público Federal para o aforamento da ação, ausência de especificação da pessoa jurídica interessada na condenação a possibilitar a regular formação de litisconsórcio ativo necessário, e a ocorrência de litispendência com a ação criminal que tramita perante a Colenda 2ª Vara desta Subseção da Justiça Federal. No mérito argumentou, em suma, a total improcedência do pedido.
Impugnada a contestação (fls. 139/146), à fl. 156 foi determinada a intimação do INSS para manifestação nos moldes do art. 17 da Lei nº 8.429/1992, a requisição do procedimento administrativo-disciplinar instaurado em desfavor do réu, e de cópias de requerimentos de aposentadorias apresentados por segurados que foram nominados. Após a manifestação do Instituto Nacional do Seguro Social-INSS (fls. 163/164), vieram aos autos as cópias requisitadas (fls. 173/865 e 867/1232).
Instadas, as partes se manifestaram sobre os documentos novos trazidos aos autos (fl. 1243, 1245 e 1251/1261). Juntada certidão com breve relatório dos andamentos da ação penal distribuída à 2ª Vara desta Subseção (fl. 1266), às fls. 1269/1271 foi proferida r. decisão saneadora, onde foram afastadas as preliminares suscitadas na contestação, indeferida a realização de perícia, e estabelecida a necessidade de colheita do depoimento pessoal do réu e inquirição de testemunhas.
Em audiência foi colhido o depoimento pessoal do demandado e deferida desistência da oitiva das testemunhas arroladas na inicial (fls. 1310/1312). Pelo pedido de fl. 1314 o autor trouxe aos autos cópias de depoimentos prestados por testemunhas ouvidas na ação penal que tramita perante a 2ª Vara (fls. 1315/1340), o que não foi impugnado. Inquiridas as testemunhas arroladas pelo réu (fls. 1409/1416 e 1464/1465), aberta oportunidade, as partes apresentaram alegações finais (fls. 1470/1486 e 1490/1505).

É o relatório.

Segundo o eminente 4º Promotor de Justiça da Comarca de Santos/SP, Dr. Carlos Eduardo Terçarolli(1):

“...improbidade administrativa é o designativo técnico para a chamada corrupção administrativa, que, sob diversas formas, promove o desvirtuamento da Administração Pública e afronta os princípios nucleares da ordem jurídica (Estado de Direito, Democrático e Republicano), revelando-se pela obtenção de vantagens patrimoniais indevidas às expensas do erário, pelo exercício nocivo das funções e empregos públicos, pelo ‘tráfico de influência’ nas esferas da Administração Pública e pelo favorecimento de poucos em detrimento dos interesses da sociedade, mediante a concessão de obséquios e privilégios ilícitos”.

A presente ação foi proposta pelo Ministério Público Federal em desfavor de Pachoal Mazzuca Neto, em razão de denúncia feita por segurado da Previdência Social no sentido de o demandado, na qualidade de médico perito do INSS, em consultório localizado à Rua Ory Pinheiro Brizola nº 2-47, Bauru/SP, ter solicitado ao paciente-segurado o fornecimento de trinta folhas de cheques em branco como meio de assegurar a manutenção do afastamento das atividades exercidas na CPFL-Companhia Paulista de Força e Luz, em razão de acidente de trabalho, e permanecer recebendo benefício previdenciário.
Com base na denúncia referida, o Ministério Público Federal ingressou com pedido de busca e apreensão, ocorrendo o deferimento da medida (autos nº 1999.61.08.004069-7, cópias às fls. 14/19 destes), e a apreensão no consultório do réu dos objetos descritos no auto de busca a arrecadação anexado às fls. 22/26, entre eles uma agenda pessoal com anotações manuscritas, fichas médicas, envelopes pardos contendo fichas de pacientes e/ou talonários de cheques em branco assinados, cheques preenchidos, folhas de cheques em branco assinadas, e folhas de cheques preenchidas com valores determinados.
Com apoio nos elementos colhidos durante a diligência efetuada, o Ministério Público Federal ofertou denúncia contra Paschoal Mazzuca Neto por aperfeiçoamento de condutas tipificadas no art. 317 do Código Penal, sendo deflagrada, assim, a ação penal distribuída à 2ª Vara desta Subseção sob o nº 1999.61.08.006600-5 (cópia às fls. 27/37). A ocorrência também foi comunicada ao INSS. Foi instaurado o procedimento administrativo disciplinar juntado por cópia às fls. (173/865), que culminou com a demissão do réu por Portaria do Ministro da Previdência publicada no Diário Oficial da União de 13.06.2000 (cópias às fl. 860/861).
A forma de agir reiteradamente adotada pelo réu, consistente na exigência a segurados da Previdência de fornecimento de cambiais, preenchidas ou em branco, como forma de manutenção de afastamento por motivos médicos das atividades laborais, também chegou ao conhecimento da imprensa, como se verifica do documento juntado por cópia à fl. 186, missiva enviada pelo Editor Chefe do Departamento de Jornalismo da Rede Record de Televisão ao representante do Ministério Público Federal, que reproduzo:

“Prezado Senhor,

Rede Record de Televisão, com endereço na avenida José Henrique Ferraz, 19-20, em Bauru, vem respeitosa à presença de V. Exa. Informar a realização de gravação de diálogo, em 05/08/99, por volta das 19:00 horas, através de vídeo e áudio, mantido entre Servidor Público Federal, Sr. Paschoal Mazzuca, perito do INSS, e segurado, onde se verificará a possível evidência de crime de corrupção passiva.
Informa, ainda, que referida gravação é parte de série de reportagens realizadas por esta emissora, através de seu departamento de jornalismo, com vistas à investigação das perícias médicas do INSS.
A presente informação destina-se à comunicação formal da gravação, estando a mesma disponível nesta data, 05/08/99, para averiguações eventualmente realizadas por esta Procuradoria.” (cópia à fl. 186).
No curso do procedimento administrativo-disciplinar que redundou na demissão do réu do cargo de médico do quadro de pessoal do INSS, sob o manto do contraditório e da ampla defesa, foram colhidas provas precisas no sentido dele ter solicitado e recebido, por diversas vezes, o equivalente a trinta por cento do valor de benefícios previdenciários, como condição para a manutenção ou concessão de tais benefícios. Essa é a conclusão da comissão de inquérito, juntada por cópia às fls. 851/859, que transcrevo em parte:

“................................................

4. Após minuciosa análise das provas materiais, dos depoimentos, bem como apreciação dos demais elementos probatórios dos autos, decidiu a Comissão de Inquérito, na peça de Ultimação de Instrução, (fls. 552/556) indiciar o servidor PASCHOAL MAZZUCA NETO, médico perito SIAPE nº 1107166, por não ser leal a Instituição a que serve; não manter conduta compatível com a moralidade administrativa; valer-se do cargo para lograr proveito próprio e a terceiros, em detrimento da função pública e improbidade administrativa.

5. O indiciado foi devidamente citado, para apresentar defesa escrita na forma do art. 161, da Lei 8.112, de 11 de dezembro de 1990, no prazo de dez dias, a qual foi oferecida às fls. 560/599.

6. A Comissão de Inquérito, em seu Relatório de fls. 634/663, examinou todos os argumentos aduzidos pela defesa, considerando que em nada alteraram seu indiciamento, bem como a verdade dos fatos apurados, os quais se encontram comprovados pelos documentos e testemunhas, tendo sido mantido o indiciamento do acusado.

7. Todas as formalidades procedimentais essenciais ao processo disciplinar, bem como a fase instrutória, foram concluídas em obediência aos princípios da legalidade e da ampla defesa, bem como aos requisitos insculpidos no art. 148 e seguintes da Lei nº 8.112/90, com a colheita de provas materiais, depoimento de testemunhas e do próprio acusado, não havendo qualquer vício insanável.

..............................................

10. Examinando o conjunto fático-probatório dos autos, é fácil verificar que PACHOAL MAZZUCA NETO solicitava e recebia o equivalente a trinta por cento do valor do benefício percebido por segurados prometendo-lhes promover a manutenção ou concessão de benéficos previdenciários, motivo pelo qual a Comissão de Inquérito sugeriu a aplicação da pena de demissão ao acusado por ele se valer do cargo público para lograr proveito próprio, em detrimento da dignidade da função pública e por improbidade administrativa.

11. Impende deixar firmado que foram reavaliados vinte e seis procedimentos periciais efetivados pelo acusado, dentre todos constatou-se que dezesseis segurados estavam habilitados para retornar às suas atividades laborativas, sendo certo que receberam pagamentos de benefícios mesmo estando aptos para o trabalho.

12. Necessário pé reconhecer a lesão aos cofres públicos, caracterizada pelo pagamento sem o respectivo fato gerador de direito. É pacífico o entendimento de que não é necessário o auferimento do quantum para caracterizar a lesão ao patrimônio público, bastando a existência da lesão.

13. Em face da lesão causada aos patrimônio público pelo médico perito do INSS, PASCHOAL MAZZUCA NETO, resta evidente que sua conduta resultou em prática de improbidade administrativa (art. 132, inciso IV, da Lei nº 8.112, de 11 de novembro de 1990),...” (fls. 852 e 857).

No curso da instrução deste foi colhido o depoimento pessoal do autor, e ouvidas testemunhas por ele arroladas (fls. 1310/1312, 1409/1416 e 1464/1465). Em suma, o réu sustentou jamais ter exigido cheques pós-datados de beneficiários do INSS, e que tal procedimento somente era adotado quanto aos pacientes particulares, como meio de garantir o retorno do cliente a nova consulta. Afirmou que somente opinava pela concessão do benefício quando verificada incapacidade, acreditando ser vítima de complô orquestrado pelo Sindicato dos Bancários.

As testemunhas ouvidas às fls. 1411/1414, em síntese, afirmaram ter trabalhado com o réu por vários anos, e que nunca presenciaram ele ter exigido dinheiro de segurados da Previdência. Destacaram que o réu trata-se de pessoa querida e profissional respeitado. Quase em uníssono, alertaram que a decisão final sobre a existência de invalidez era da alçada exclusiva do médico chefe do setor de perícias. O teor dos depoimentos prestados pelas demais testemunhas ouvidas durante a instrução, ao meu sentir, deve ser interpretado com reservas.

Com efeito, da análise de tais depoimentos extrai-se que as testemunhas nutrem gratidão para com o réu por atendimentos realizados, ou amizade amealhada em anos de convivência. De qualquer forma, creio que esses elementos de prova não podem prevalecer sobre as robustas provas colhidas no procedimento administrativo disciplinar (fls. 173/865), da prova consubstanciada nos requerimentos de aposentadorias encartados às fls. 867/1232, e, sobretudo, nos depoimentos de testemunhas ouvidas nos autos da ação penal que tramita perante a 2ª Vara desta (fls. 1315/1340).

Tais provas não foram impugnadas ou devidamente contrastadas. Causa espécie a forma de agir adotada pelo réu, narrada nos depoimentos colhidos na ação criminal em trâmite perante a 2ª Vara desta Subseção, com observância do contraditório e da ampla defesa, testemunhos esses que tornam certa a adequação da conduta do demandado ao disciplinado no art. 9º, caput, e inciso I, da Lei nº 8.429/1992, acarretadora de incontestes prejuízos aos cofres da Previdência Social e à moral pública.

Observe-se o depoimento prestado pela testemunha Edson Izidoro Barros, juntado à fl. 1315:

“ na época o depoente estava afastado do serviço por força de acidente do trabalho, LER. Na segunda perícia porque passou perante o réu, este exigiu do depoente vinte e cinco cheques no valor de R$ 450,00 cada, dizendo que seria necessário pois senão o depoente acabaria prejudicado no seu benefício. Relatou ao réu que não tinha condições de atender essa exigência, mas ele foi incisivo reafirmando que o depoente seria prejudicado se não entregasse os cheques. O réu até fez menção de que esses cheques seriam distribuídos, por isso a exigência de vinte folhas. Acabou cedendo e posteriormente entregou os cheques para o réu, foram descontados quatro cheques, posteriormente tomou conhecimento nos meios de comunicação do envolvimento do réu em esquema no INSS, acabou sustando o pagamento dos cheques restantes. Posteriormente o réu entrou em contato com o depoente pedindo para que dissesse que os cheques referiam-se a um tratamento médico...”

Merece registro o depoimento prestado por Carlos Henrique de Castro, constante do termo anexado à fl. 1316:

“Ficou afastado do seu trabalho por dois anos e meio em razão de doença profissional, tendo sido atendido várias vezes pelo réu. Em certa ocasião o réu pediu ao depoente para que fosse ao endereço, que o depoente acredita seja a residência do réu. O depoente imaginou que fosse um trâmite legal, e por isso, no período da tarde foi com sua companheira até o local combinado e lá chegando o réu disse que de fato o depoente possuía uma doença degenerativa e receberia a aposentadoria por invalidez, mas que para isso acontecesse ‘teria um preço’. O depoente desde o início, esclareceu ao réu que imaginou que estava no local em razão de um trâmite normal e legal. Em que pese esta fato, o réu insistiu dizendo o depoente precisava entregar trinta (30) cheques assinados em branco para receber o benefício. O depoente disse que não iria fazer e disse que era perigoso e que ainda tinha o perito chefe, o Dr. Gomes, mas o réu esclareceu que não iria ter problemas, pois iria dar uma parte do dinheiro para o Dr. Gomes. Melhor esclarecendo, o réu disse que iria ‘endossar’ para várias pessoas dentro do INSS. O depoente ficou nervoso com muito medo do que estava acontecendo e negou qualquer tipo de proposta. Depois que foi embora, retornou a residência do réu no dia seguinte, reiterou ao réu que não iria aceitar a proposta. O réu ameaçou o depoente dizendo que daquele dia em diante ‘as portas do INSS estariam fechadas para o depoente. Esclarece que o réu ainda perguntou ao depoente se ele possuía casa própria, e depois da resposta afirmativa, o réu falou que o depoente poderia vender a sua casa e comprar uma financiada e, com a aposentadoria o financiamento ficaria quitado.”

Miguel Dimas Lourenço prestou o depoimento constante do termo de fls. 1331 e verso, quando noticiou:

“nadador, frequentador do SESI local conheceu o acusado como médico que fazia os exames e certa feita ofereceu-se ou colocou-se à disposição para atender o depoente em seu consultório. Tendo o depoente vivenciado ao longo da década de 90 dificuldades muitas com problemas de saúde, procurou, então, sim, pelo denunciado em seu consultório nos idos de 1999, pois tinha ouvido falar por terceiros que ele era um médico que além de perito do INSS procurava fazer o papel que a Previdência mesma não cumpria: não poucas vezes o depoente se viu em condições para o trabalho e teve que permanecer dele afastado por desautorização médica da Previdência mesma...tendo sido atendido pelo denunciado, explicou-lhe o depoente estava sendo preparado em uma readaptação para o trabalho, mas não se sentia apto ao retorno, ao que lhe explicou o acusado interferiria, sim, para evitar aquele indesejado retorno para o trabalho, tendo mencionada consulta sido paga. Tão logo narrado o seu caso ao acusado, percebeu o depoente conhecia este sua situação de prontuários ou históricos na Previdência, pois ele em seguida se manifestou dizendo tinha estudado o caso do depoente, sabia de sua dificuldade e procuraria ajudá-lo a permanecer sob afastamento, só que mediante contribuição, que seria necessária para fornecer dinheiro aos componentes que trabalhassem no caso. Tendo o ora depoente a princípio estranhado, inclusive, procurou o ora acusado, a título de tranquilização, mostrar-lhe cheques de outros pacientes, como uma atitude corriqueira. Pedindo o depoente um tempo para pensar, explicou-lhe o ora denunciado aquilo não era possível, pois estava lhe confiando algo importante e precisava o depoente confiar no denunciado, pois aquele era o único caminho e caso não ocorresse daquela maneira, haveria prejuízo na intenção de permanência no afastamento do trabalho. Viu-se, então, o ora depoente, sob a pressão de contribuir, como acabou o fazendo. Foram solicitadas ao depoente trinta folhas de cheque, tendo este lhe respondido seu talão comportava vinte e estava em andamento de consumo, ao que se resolveu fornecendo-lhe o depoente dez folhas e tendo o ora acusado lhe explicado depois ele levasse as demais folhas. O valor também causou estranheza ao depoente, pois deveria entregar em branco as folhas, ao que lhe explicou o acusado, cada qual equivaleria a trinta por cento do benefício previdenciário recebido, uma após a outra, a ser descontada a partir do mês seguinte. Até que preencheu o depoente cerca de duas ou três folhas de cheque no valor ali calculado, tendo as demais ficado em branco, pois o acusado lhe explicou podia variar o valor, precisava confiar nele, estava a tratar com gente adulta, ninguém estava a saber do que se passava e aquela era a prática ali. Deu-se o desconto de três cheques, após o que, não concordando o depoente com aquela conduta, resolveu denunciar o ora acusado. (fl. 1331 e verso).

Entre tantos outros, o depoimento prestado pela testemunha Décio Luiz Lagatta Júnior, juntado às fls. 1339/1340, merece detida atenção:

“...fui informado por um conhecido, que sabia que eu não tenho a visão direita desde criança, que essa ausência de visão poderia me ajudar a aposentar. Esse mesmo conhecido mencionou que o Paschoal Mazzuca Neto estava conseguindo aposentar várias pessoas. Como eu estava desempregado, e já havia contribuído por vinte e cinco anos, aos cofres da Previdência, decidi procurar o médico Paschoal, apesar de imaginar que o problema na vista direita, que nunca tinha me atrapalhado, não seria motivo para aposentação, mesmo porque não tinha tempo de contribuição suficiente. Resolvi procurar o médico por curiosidade. Marquei uma consulta no consultório dele, que funcionava em sua residência. Fui lá com minha família e o dr. Paschoal afirmou que meu problema de visão era motivo para concessão da aposentadoria. Eu então indaguei acerca do procedimento necessário para conseguir a aposentadoria. Ele então respondeu que eu necessitaria dar entrada num procedimento administrativo perante o INSS, procedimento que passaria por ele posteriormente e ao qual ele daria um laudo pericial afirmando que meu caso ensejaria aposentadoria. Eu então voltei a indagar como seria isso, ao que ele respondeu que tinha uma noção de qual seria o valor dessa aposentadoria e eu necessitaria deixar alguns cheques em branco para pagamento de custas e despesas que ele teria para aprovar a minha aposentadoria. Eu achei tudo isso muito estranho e ele respondeu que esse procedimento era comum, e muitas pessoas assim faziam. Eu não retornei para dar continuidade ao procedimento. Posteriormente, eu soube por meio do jornal local que esse médico havia adotado a conduta acima descrita com várias pessoas e tal fato constitui crime. Eu fui procurado pela Polícia Federal, apesar de não ter dado entrada em qualquer pedido de aposentadoria, porque na busca e apreensão efetuada na casa do médico, foi apreendida uma agenda em que constava meu nome e dos demais pacientes que ele havia consultado. Eu expliquei na Polícia Federal o que ocorreu e fui liberado.”

Revista Consultor Jurídico