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COMBATE À AIDS É MAIS CARO NO BRASIL

17/05/2005 - Agência Aids

Remédios custam até oito vezes mais do que na África do Sul

Drogas anti-retrovirais custam até oito vezes mais do que na África do Sul, cujo PIB per capita é três vezes maior
Qual a diferença entre o tratamento de um paciente de Aids brasileiro e o de um sul-africano? No Brasil, onde o governo respeita patentes internacionais e é obrigado pela Constituição a fornecer medicamentos a todos os portadores do vírus HIV, uma pílula de drogas anti-retrovirais custa até oito vezes mais do que na África do Sul.
A distorção é um dos frutos da política de preços dos grandes laboratórios. Poder aquisitivo da população, por exemplo, não é critério. O Produto Interno Bruto (PIB) per capita brasileiro (US$ 3,3 mil) é um terço do que o da África do Sul (US$ 10,7 mil). Mas aqui cada comprimido do anti-retroviral Tenofovir, do laboratório Gilead Science, custa US$ 7. Na África do Sul - e em 90 outros países -, a mesma pílula custa US$ 0,86. Um levantamento da Organização Mundial da Saúde (OMS) concluiu que o preço humanitário do produto, incluindo recompensa ao laboratório, seria de US$ 1,5. O Tenofovir é caro porque, embora sua matéria-prima seja velha conhecida (foi descoberta em 1985), ainda é protegido por patentes.
Outro anti-retroviral, o complexo Ritonavir/Lopinavir, fabricado pelo Laboratório Abbott, também custa oito vezes mais no Brasil. Menos caro, o Efavirenz, produzido pela Merck Sharp & Dohme, custa aos brasileiros US$ 1,57 por comprimido. Na África do Sul, sai por US$ 0,96 (48,9% menos), enquanto seu custo humanitário deveria girar em torno de US$ 1,2. Um dos argumentos da indústria é de que na África do Sul a prevalência (número de soropositivos) beira 20% da população. O raciocínio confirma que o preço dos remédios varia conforme o mercado consumidor - e sua legislação -, e não de acordo com o custo de fabricação.
- Os laboratórios nunca negociam em termos vantajosos para os brasileiros. Por isso, insistimos no uso da licença compulsória. Ou optamos pelos genéricos, ou não conseguiremos pagar essa conta - diz Carlos Passareli, assessor de projeto da Associação Brasileira Interdisciplinar de Aids, referindo-se aos gastos com anti-retrovirais do Ministério da Saúde.
Dois laboratórios estão dispostos a concessões
A pressão econômica sobre a política de combate à Aids - que empenha 67% de suas verbas em apenas quatro drogas importadas - tornou-se tão insustentável que a União se viu obrigada a solicitar aos mesmos três laboratórios a Licença Voluntária para produção de genéricos. Caso não receba autorização para fabricação local, pode optar pela Licença Compulsória, quebrando legalmente o monopólio.
- A África do Sul realmente tem um preço diferenciado. Mas o que o Ministério da Saúde deve fazer é buscar recursos. Quebrando patentes o país vai sofrer problemas externos sérios e não vai ganhar nada - avisa Gabriel Tannus, presidente da Associação da Indústria Farmacêutica de Pesquisa (Interfarma).
Antes que seus lucros seja pulverizados, duas das indústrias estão em busca de soluções conciliatórias. A Merck pode conceder a licença voluntária do Efavirenz - atitude que já havia tomado em 1996, quando o preço de seus produtos foi reduzido em até 64% na gestão do então ministro José Serra. Já o Laboratório Abbott anunciou que produzirá seus anti-retrovirais no Rio de Janeiro, em um investimento de US$ 27 milhões até 2007. A decisão de nacionalizar produtos quando há ameaça de quebra de patentes é vista como coincidência por Santiago Luque, gerente-geral da Abbott. Para a economia brasileira, a "coincidência" representará menos US$ 150 milhões em importações a partir de 2007.( ANDREI NETTO)
Fonte: Última Hora – RJ
Diretor do Programa de Aids já tinha apontado o problema referente ao preço dos anti-retrovirais
Em evento realizado em São Paulo no último mês, o diretor do Programa Nacional de DST/AIDS, Pedro Chequer, afirmou que o governo brasileiro não paga um preço “justo” pelos medicamentos anti-retrovirais. “Um preço justo seria a soma de todos os gastos para a produção do remédio (insumos, mão de obra, etc) mais 15% de lucro do fabricante”, explica.
O diretor informa que o anti-retroviral Zidovudina custa duas vezes mais que o valor justo; o DDI 3,5 vezes mais e o Tenofovir quase 10 vezes mais. “Pagamos algo inaceitável no ponto de vista econômico e ético”, disse.
Ele citou ainda o D4T ( 2, 4 vezes mais), 3TC: (3,3 vezes), Nevirapina (1,5 vezes), Efavirenz (1,6 vezes), DDI: (3,4 vezes), DDI entérico: (6,8 vezes), Lopinavir (1,9 vezes) e Nelfinavir (1 vez mais).
Na ocasião, o diretor de Comunicações Coorporativas da Merck Sharp & Dohme (fabricante do Efavirenz), João Sanches, respondeu as críticas, afirmando que os cálculos de Chequer devem ser diferentes aos da sua empresa. “O preço vendido para o Brasil se aproxima ao da África (venda a preço de custo, segundo ele) equivale a 14% do preço nos Estados Unidos.”