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DOCUMENTO - TRANSMISSÃO, CRIME E HIV

30/06/2012 - GIV

Declaração de Oslo sobre a Criminalização do HIV

Declaração de Oslo sobre a Criminalização do HIV
Preparada por membros da sociedade civil internacional em Oslo, Noruega, em 13 de fevereiro de 2012

1. Um corpo crescente de evidências sugere que a criminalização da não revelação da infecção pelo HIV, da exposição potencial ao HIV e da transmissão não intencional do HIV está trazendo mais danos do que benefícios em termos de seu impacto na saúde pública e direitos humanos.1
2. Medidas criadoras de um ambiente que permita às pessoas procurar apoio, testagem e tratamento oportuno, e que possam revelar a sua seropositividade com segurança constituem uma melhor alternativa que o uso do direito penal. 2
3. Embora possa haver um papel limitado para o direito penal nos raros casos em que as pessoas transmitam o HIV dolosamente, preferimos ver as pessoas vivendo com HIV apoiadas e empoderadas a partir do momento do diagnóstico, de modo que até mesmo esses casos raros possam ser prevenidos. Isso requer uma abordagem da prevenção do HIV não punitiva, nem penalizadora, centrada no seio das comunidades, onde são encontradas as competências e o entendimento mais apropriados das questões relacionadas ao HIV.3
4. As leis penais específicas para o HIV existentes devem ser revogadas, de acordo com as recomendações da ONUSIDA. 4 Se, após uma profunda revisão nacional baseada em evidências, os processos judiciais relacionados com o HIV ainda forem considerados necessários, eles devem estar baseados em princípios de proporcionalidade, de previsibilidade, de intencionalidade, causalidade, e não discriminação; devem estar informados pela ciência e informação médica mais atualizadas relacionadas com o HIV; baseados no dano, em vez de baseados no risco do dano, e serem consistentes tanto com os objetivos de saúde pública e como com as obrigações internacionais de direitos humanos. 5
5. Sempre que a lei geral possa ser ou estiver sendo usada para processos judiciais relacionados com o HIV, a natureza exata dos direitos e responsabilidades das pessoas vivendo com HIV devem ser clarificadas, nos termos da lei, de preferência através de diretrizes do Ministério Público e da Polícia produzidas em consulta com as principais partes interessadas, para assegurar que as investigações policiais sejam apropriadas e garantir que as pessoas com HIV tenham acesso adequado à justiça.

Solicitamos respeitosamente que os Ministérios da Saúde e da Justiça e outros relevantes formuladores de políticas e atores do sistema de justiça penal também levem em conta os seguintes pontos, em qualquer consideração sobre se deve-se ou não usar a lei penal em casos relacionados com o HIV:

6. A epidemia de HIV é nutrida pelas infecções por HIV não diagnosticadas, e não pelas pessoas que conhecem seu status positivo para o HIV.6 O sexo sem proteção inclui riscos de muitas eventualidades possíveis, positivas e negativas - incluindo o risco de contrair infecções sexualmente transmissíveis, como o HIV. Devido ao elevado número de infecções não diagnosticadas, confiar na revelação do diagnóstico de HIV pelo parceiro (a) como meio de proteção - e processar as pessoas pela ausência de revelação - pode e leva a uma falsa sensação de segurança.
7. A infecção pelo HIV é apenas uma das muitas doenças sexualmente transmissíveis ou transmissíveis que podem causar danos a longo prazo. 7 Ressaltar o HIV com leis específicas ou procedimentos criminais aprofunda a estigmatização das pessoas vivendo com o HIV e afetadas pelo HIV. O estigma relacionado ao HIV é a maior barreira para a testagem, a captação para tratamento, a revelação e o sucesso de um país em "chegar a zero novas infecções, mortes relacionadas à Aids e discriminação zero".8
8. As leis penais não mudam o comportamento enraizado em complexas questões sociais, especialmente o comportamento baseado no desejo e impactado pelo estigma relacionado ao HIV.9 Tal comportamento é alterado pelo aconselhamento e apoio para as pessoas vivendo com HIV que visem alcançar a saúde, dignidade e empoderamento.10
9. Em alguns países do mundo, nem o sistema de justiça criminal nem os meios de comunicação estão bem equipados, na atualidade, para lidar com casos criminais relacionados com o HIV.11 As autoridades competentes devem assegurar a formação adequada relacionada com o HIV para a polícia, promotores, advogados de defesa, juízes, júris e a mídia.
10. Uma vez que o status sorológico para o HIV de uma pessoa for involuntariamente divulgado na mídia, ele estará sempre disponível através de uma pesquisa na internet. As pessoas acusadas de 'crimes' relacionados ao HIV dos quais eles não são (ou não deveriam ser declarados) culpados, têm direito à privacidade. Não há nenhum benefício de saúde pública na divulgação da identidade destas pessoas nos meios de comunicação; se houver a necessidade de informar os parceiros anteriores para fins de saúde pública, devem ser seguidos protocolos de notificação de parceiros éticos e confidenciais. 12
Perguntas Frequentes
Pergunta: Quem elaborou a Declaração de Oslo?
Resposta: Somos um grupo de indivíduos e organizações da sociedade civil do mundo todo preocupados com o uso inadequado e excessivamente amplo do direito penal para regular e punir as pessoas que vivem com o HIV por comportamento que, em qualquer outra circunstância, seria considerado lícito. Estamos trabalhando para acabar com tal injustiça. Nosso grupo é dirigido e inclui pessoas vivendo com HIV, e é apoiado por ativistas de HIV comprometidos. Somos especialistas em áreas que abrangem temas médicos, sociais, éticos, políticos, de direitos humanos e as questões judiciais relacionadas ao HIV e à lei criminal.
P: Por que é chamada de Declaração de Oslo?
R: Nós viemos juntos a Oslo, na Noruega, na véspera da Consulta Política Global de Alto Nível sobre a Ciência e o Direito da Criminalização da não Revelação da sorologia para o HIV, Exposição e Transmissão do HIV, convocada pelo Governo da Noruega e do Programa Conjunto das Nações Unidas para HIV/AIDS (ONUSIDA).
O objetivo da Consulta Política de Alto Nível era fornecer um fórum global em que os formuladores de políticas e outras partes interessadas pudessem considerar suas leis e políticas atuais em relação à criminalização da não revelação, exposição e transmissão do HIV, à luz dos dados científicos, de saúde, de saúde pública e legais mais recentes e relevantes. Embora nossa Declaração não seja é um documento oficial da Consulta Política de Alto Nível, apoiamos o objetivo da reunião, e encorajamos os formuladores de políticas a rever as suas próprias leis e políticas, e tomar todas e quaisquer medidas necessárias para alcançar os melhores resultados possíveis em termos de justiça e proteção da saúde pública a fim de apoiar respostas nacionais ao HIV eficazes e as obrigações internacionais de direitos humanos.
P : Qual é o estado atual de criminalização HIV?
R : Em muitos países do mundo estão ocorrendo processos judiciais, quer no âmbito de estatutos criminais específicos para o HIV quer sob uma ampla gama de leis penais gerais, muitas vezes inadequadas. 13 A maioria dos casos criminais tem sido enquadrada pelo Ministério Público e os meios de comunicação como sendo casos de transmissão do HIV "deliberada" ou "intencional" quando, na verdade, a grande maioria não envolveu dolo nem foi presumida ou mesmo provada a transmissão do HIV.14
Nos últimos anos, têm aumentado tanto o número de processos quanto o número de novas leis penais específicas para o HIV 15, ao mesmo tempo que a resposta de saúde pública para o HIV - baseada numa abordagem de direitos humanos e informada sobre evidências16 - reduziu significativamente o número de novas infecções e melhorou muito a qualidade de vida das pessoas vivendo com HIV.17 No entanto, vários países estão repensando agora sua abordagem do uso do direito penal, devido à sua consciência dos avanços da ciência e da medicina relacionados ao HIV.17
P : De qual maneira as leis penais e os processos judiciais relacionados com o HIV prejudicam os esforços de prevenção do HIV?
Resposta : Muitos especialistas expressam colocam preocupações sobre o amplo dano colateral inerente a uma abordagem da prevenção do HIV baseada em regulamentação administrativa e criminalização. 19 Em particular, há evidências de um impacto negativo na saúde pública em termos de:
• deturpar e exagerar os riscos e danos relacionados com o HIV. Isso contribui para o aumento de mitos sobre o HIV, incluindo os riscos sobre a transmissão e a melhor forma de proteger a si mesmo.
• aumentar o estigma relacionado ao HIV. Isto tem um efeito adverso sobre a vontade de uma pessoa para aprender, ou discutir sobre o HIV.
• minar a importância do conhecimento e da responsabilidade pessoais como uma componente chave de um pacote de prevenção do HIV. A prevenção do HIV dentro de uma relação sexual consensual é - e deve ser entendida como - uma responsabilidade partilhada.
• desestimular às pessoas de saber o seu estado sorológico. A falta de diagnóstico (e, portanto, de tratamento) do HIV prejudica a saúde pública e a saúde individual.20
P : De qual modo as leis penais e os processos relacionados com o HIV prejudicam os direitos humanos?
Resposta: Existe um corpo crescente de evidências de que tais leis e processos estão tendo um impacto negativo sobre todas as pessoas que vivem com HIV21, devido a que:
• Criam confusão e medo sobre os direitos e responsabilidades nos termos da lei.
• Criam e mantêm desestímulos para revelar a soropositividade a parceiros sexuais.
• Criam e mantêm desestímulos para revelar comportamentos de risco relacionados com o HIV aos profissionais de saúde.
Além disso, evidências do mundo inteiro22 também sugerem:
• Investigações / acusações seletivas e / ou arbitrárias.
• investigações policiais impróprias e insensíveis que podem resultar na revelação inadequada da sorologia, perda de emprego e altos níveis de angústia.
• Investigações de mídia estigmatizantes, incluindo nomes, endereços e fotografias de pessoas com HIV ainda não consideradas culpadas de qualquer crime.
• Um acesso à justiça limitado para as pessoas com HIV.
• Sentenças e penalidades que muitas vezes são vastamente desproporcionais a qualquer dano potencial ou realizado.23
P : Por que é que a criminalização HIV prejudica específicamente às mulheres?
Resposta: Os políticos e formuladores de políticas podem acreditar que estão protegendo às mulheres contra o HIV, propondo e sancionando leis penais específicas para o HIV. Mas a criminalização do HIV não protege as mulheres da coerção ou da violência. Por outro lado, leis que empoderam as mulheres através da criação da igualdade social, legal e financeira para elas, e a criminalização do estupro marital protegem-nas efetivamente. A criminalização do HIV faz mais mal do que bem para as mulheres, porque:
Mulheres são mais propensas a serem processadas, uma vez que são muitas vezes as primeiras em um relacionamento a conhecer o seu estado sorológico devido ao teste de HIV de rotina durante a gravidez, e são menos propensas a revelar com segurança a sua soropositividade para o seu parceiro como resultado da desigualdade nas relações de poder, dependência econômica, e altos níveis de violência de gênero dentro das relações.24
• Mulheres com HIV enfrentam a possibilidade de serem impedidas de engravidar, e / ou de serem processadas por passar o HIV para seus filhos no útero ou durante a amamentação, reduzindo suas escolhas e direitos reprodutivos.25
P: Como posso assinar à Declaração de Oslo?
Resposta: acesse a página web http://www.hivjustice.net/oslo/oslo-declaration/ . Depois clique em SIGN THE PETITION . A seguir preencha os dados de seu nome e/ou organização, país e endereço de correio eletrônico. Finalmente clique em SUBMIT.
P : Onde posso aprender mais sobre criminalização do HIV?
Resposta: Todas as evidências de apoio às nossas afirmações podem ser encontradas nas referências, que têm links para os documentos originais. Visite também os seguintes sites para mais informações:
AIDSLEX/CRIMINALIZATION OF HIV TRANSMISSION LIBRARY (INTERNATIONAL)
CANADIAN HIV/AIDS LEGAL NETWORK/HIV CRIMINALISATION PUBLICATIONS
CENTER FOR HIV LAW & POLICY/POSITIVE JUSTICE PROJECT (US)
GNP+/GLOBAL CRIMINALISATION SCAN (INTERNATIONAL)
IPPF/HIV AND THE LAW (INTERNATIONAL)
NAM/HIV AND THE CRIMINAL LAW (INTERNATIONAL)
POZ/HIV CRIMINALIZATION (US)
SERO/SERO PROJECT (US)

Além disso, os seguintes filmes documentários fornecem mais informações sobre estes temas:
How Could She, Sweden, 2010
Legalizing Stigma, US, 2010
Verdict on a Virus, UK, 2011
HIV Is Not a Crime, US, 2011
Perpetuating Stigma, US, 2012

Referências:
1.UNAIDS. Report of the Expert Meeting on the Scientific, Medical, Legal and Human Rights Aspects of Criminalisation of HIV Non-disclosure, Exposure and Transmission, 31 August- 2 September 2011. Geneva, February 2012.
2 UNAIDS/UNDP. Policy Brief: Criminalization of HIV Transmission. Geneva, July 2008; Open Society Institute. Ten Reasons to Oppose the Criminalization of HIV Exposure or Transmission. 2008; IPPF,GNP+ and ICW. Verdict on a Virus. 2008. See also: IPPF. Verdict on a Virus (documentary) 2011.
3 GNP+/UNAIDS. Positive Health Dignity and Prevention: A Policy Framework. Amsterdam/Geneva, January 2011.
4 UNAIDS/UNDP. Policy Brief: Criminalization of HIV Transmission. Geneva, July 2008.
5 UNAIDS. (2012) Op. cit.
6 Marks G et al. Estimating sexual transmission of HIV from persons aware and unaware that they are infected with the virus in the USA. AIDS 20(10):1447-50, 2006; Hall HI et al. HIV transmissions from persons with HIV who are aware and unaware of their infection, United States. AIDS 26, online edition. DOI: 10.1097/QAD013e328351f73f, 2012.
7 Bernard EJ, Hanssens C et al. Criminalisation of HIV Non-disclosure, Exposure and Transmission: Scientific, Medical, Legal and Human Rights Issues. UNAIDS, Geneva, February 2012; Carter M. Hepatitis C surpasses HIV as a cause of death in the US. Aidsmap.com, 21 February 2012.
8 UNAIDS. Getting to Zero: 2011-2015 Strategy. Geneva, December 2010.
9 Bernard EJ and Bennett-Carlson R. Criminalisation of HIV Non-disclosure, Exposure and Transmission: Background and Current Landscape. UNAIDS, Geneva, February 2012.
10 GNP+/UNAIDS (2011) Op. cit.
11 Bernard EJ and Bennett-Carlson R (2012) Op. cit.
12 UNAIDS. Opening up the HIV/AIDS epidemic: Guidance on encouraging beneficial disclosure, ethical partner counselling & appropriate use of HIV case-reporting. Geneva, 2000.
13 GNP+. The Global Criminalisation Scan Report 2010. Amsterdam, 2010; Bernard EJ. Criminal HIV Transmission Blog (2007-12).
14 Bernard EJ and Bennett-Carlson R (2012) Op. cit.
15 Ibid.
16 UNAIDS (2010) Op. cit.
17 WHO, UNAIDS, UNICEF. Global HIV/AIDS Response: Epidemic update and health sector progress towards Universal Access 2011 Progress Report. Geneva, 2011.
18 UNAIDS. Countries questioning laws that criminalize HIV transmission and exposure. 26 April 2011; Bernard EJ. Getting tough on criminalisation. HIV Treatment Update 210, Winter 2012.
19 Weait M. Intimacy and Responsibility: The criminalisation of HIV transmission. Abingdon, Oxon: Routledge-Cavendish, 2007; Burris S, Cameron E, Clayton M. The criminalisation of HIV: time for an unambiguous rejection of the use of criminal law to regulate the sexual behavior of those with and at risk of HIV. Social Science Research Network, 2008; Open Society Institute. Ten Reasons to Oppose the Criminalization of HIV Exposure or Transmission. 2008; IPPF,GNP+ and ICW. Verdict on a Virus. 2008. Cameron E. Criminalization of HIV transmission: poor public health policy. HIV/AIDS Policy & Law Review 14 (2), 2009; AFAO and NAPWA. HIV, Criminal Law & Public Health Forum, Canberra. September 2011; RFSU, RFSL and HIV Sweden. HIV, Crime and Punishment. December 2011.
20 Cohen MS et al. Prevention of HIV-1 Infection with Early Antiretroviral Therapy. N Engl J Med 2011; 365:493-505.
21 Mykhalovskiy E The problem of "significant risk": Exploring the public health impact of criminalizing HIV non-disclosure. Social Science & Medicine, 2011; Bourne A, Dodds C, Weait M. Responses to criminal prosecutions for HIV transmission among gay men with HIV in England and Wales. Reproductive Health Matters 17(34):135–145, 2009; Menadue D. The impact of the criminalisation issue on HIV-positive people. In: Cameron S and Rule J (eds), The Criminalisation of HIV Transmission in Australia: Legality, Morality and Reality. Sydney, NAPWA, 2009.
22 GNP+ (2010) Op. cit.; Bernard EJ. (2007-12). Op. cit. Bernard EJ and Bennett-Carlson R (2012) Op. cit.
23 Strub S. HIV Is Not a Crime (documentary) 2011.
24 Athena Network. 10 Reasons Why Criminalization of HIV Exposure or Transmission Harms Women. 2009; In The Life Media. Perpetuating Stigma (documentary), 2012.
25 Heywood TA. State HIV disclosure forms legally inaccurate. Michigan Messenger, 7 February 2011; Heywood TA. Missouri backs off use of HIV client acknowledgment form. Michigan Messenger. 23 May 2011.

tradução GIV