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ATIVISTAS INDICAM CAMINHOS

02/05/2007 - Agência Aids

Para que o Brasil deixe de ser refém da indústria farmacêutica


O presidente do Grupo de Apoio à Prevenção à Aids (GAPA) de São Paulo, José Carlos Veloso, acredita que a licença compulsória é um passo importante que o governo está dando, “mas é complicado, pois existem dentro do próprio governo pensamentos diferentes. Enquanto o Ministério da Saúde está procurando uma solução para a sustentabilidade do Programa Nacional, pensando no bem estar da população, existe uma área econômica retrógrada que se submete às pressões do mercado internacional,” disse. Para que o Brasil não continue dependente da indústria farmacêutica, Veloso afirmou que “é necessária uma pressão muito forte por parte da sociedade civil, inclusive na mídia, para levar à frente a licença compulsória, senão o país vai cair em acordos não satisfatórios como já aconteceu anteriormente e a indústria manterá o seu monopólio. O Brasil precisa declarar a sua independência e investir no desenvolvimento tecnológico.”

Para Mário Scheffer, integrante do grupo Pela Vidda, de São Paulo, o caminho para uma maior independência vai se efetivar com duas decisões: primeiro, a licença compulsória e segundo, o investimento maciço na indústria nacional. “Como o Brasil não tem uma indústria de inovação tecnológica, de novos fármacos, sempre vamos depender da indústria farmacêutica. Não vamos resolver a curto prazo. Na verdade, são três estágios. Por enquanto, o Brasil só consegue misturar a partir de genéricos produzidos em outros países e, mesmo assim, não faz isso. Então, em primeiro lugar, é decretar a licença compulsória. Em um segundo momento, fortalecer a indústria nacional, não só para produzir remédios feitos com matéria-prima importada, mas também para passar a fabricar os princípios ativos. E em um terceiro momento, passar a ter inovação tecnológica, isso a longo prazo”, explicou o ativista. .Ele acredita que o Brasil sempre vai ser dependente de medicamentos de última geração. No caso da Aids, durante muito tempo ainda, pois sempre haverá pacientes em falência terapêutica que dependem dos últimos lançamentos. “Se a licença compulsória não for um jogo de cena, se for uma decisão política e não apenas um artifício para um acordo de preços, é um início importante. Só faz isso um país que tem a clara intenção de investir na produção local. No entanto, nenhum país, nem desenvolvido, tem condições de ser totalmente independente da indústria farmacêutica internacional,” acrescentou.

“Eu acredito que uma das medidas principais para que o Brasil deixe de ser refém da indústria é a revisão da lei de patentes, que tem vários problemas. Não tem por exemplo a figura da importação paralela, que permitiria ao Brasil comprar de outros países por preços mais baratos os mesmos remédios que adquire diretamente das empresas farmacêuticas pelos preços praticados aqui. Essa é uma faz flexibilizações previstas pelo acordo TRIPS e também em outras legislações,” declarou o membro do Comitê Nacional de Vacinas e secretário do Grupo de Incentivo à Vida, de São Paulo, Jorge Beloqui. O ativista ainda sugere que o país não conceda patentes de segundo uso ou de novas formulações. “O Brasil deu um grande presente à indústria farmacêutica quando aprovou as patentes pipeline.

Em 1996, o Brasil alterou sua Lei de Propriedade Industrial, incluindo em seus artigos 230 e 231 as chamadas patentes pipeline, constituindo uma disposição temporária por meio da qual foram aceitos depósitos de patentes em campos tecnológicos não reconhecidos até então, mesmo que tais pedidos já não cumprissem o requisito de novidade. Os depositantes tiveram um ano, pela nova lei, para depositar seus pedidos no Brasil. Esse mecanismo impactou fortemente a saúdepública, já que possibilitou o patenteamento de substâncias obtidas por processos químicos, produtos químico-farmacêuticos, medicamentos de qualquer espécie e seus processos de obtenção ou modificação. Em um ano de vigência da possibilidade de depósito de patentes pipeline foram
depositados cerca de 1.200 pedidos.

Outros caminhos apontados por Beloqui são os projetos de lei sobre a lei de patentes que tramitam na Câmara e no Senado. “Um deles, do ex-deputado Roberto Gouveia, tornava não patenteáveis os remédios usados no tratamento da Aids, foi aprovado por todas as comissões mas nunca foi ao plenário. Transferência tecnológica, investir em desenvolvimento de insumos estratégicos como os princípios ativos e hemoderivados, tudo isso é importante. Mas para isso são necessários uma atitude pró-ativa, vontade política e um compromisso com a saúde, que este governo parece não ter,” concluiu ele.